Restos de conversas. Ocorrem-me.
O visor do meu telemóvel, a correr os contactos. Sem selecção possível.
Outros Natais. Com a minha mãe embrulhada no avental que só tirava à ultima hora.
Risos. Barulho. Vontade.
Restos de conversas. Antigas. Recentes.
A memória corre-me freneticamente. Sem poiso.
Rouba-me a vontade de movimento.
A capacidade de concentração.
Restos de conversas.
Invasoras recordações.
Alheiam-me.
Acabei por poisar aqui.
Feliz Natal a todos.
sábado, dezembro 24, 2005
quinta-feira, dezembro 22, 2005
Debaixo do teu olhar
Debaixo do teu olhar
Sigo pela estrada comprida
De verde, iluminada
Ou de prata, escondida.
Debaixo do teu olhar
Descanso
Em noites mal dormidas
E conversas exaustivas.
Debaixo do teu olhar
Torno minhas
Imagens que são tuas.
Minhas… tuas…
Já nem sei.
Debaixo do teu olhar
Faço abrigo
No teu sorriso surdo
Nas tuas palavras frias
Na tua âncora presa
No teu tempo
Comigo.
Debaixo do teu olhar
Faço abrigo.
Sigo pela estrada comprida
De verde, iluminada
Ou de prata, escondida.
Debaixo do teu olhar
Descanso
Em noites mal dormidas
E conversas exaustivas.
Debaixo do teu olhar
Torno minhas
Imagens que são tuas.
Minhas… tuas…
Já nem sei.
Debaixo do teu olhar
Faço abrigo
No teu sorriso surdo
Nas tuas palavras frias
Na tua âncora presa
No teu tempo
Comigo.
Debaixo do teu olhar
Faço abrigo.
sexta-feira, dezembro 09, 2005
Purple Rain
Já tinha decidido que era esta.
Entretanto fiquei indecisa.
Pareceu-me que não vinha a propósito (se é que há algum propósito na escolha de uma música para um blog).
Depois, entendi que sim.
Na verdade, também sou teimosa. Dificilmente arrepio caminho.
Por isso, é mesmo Prince... com a música, com a letra, com a chuva.
Escolhas que se fazem.
Não há nada melhor do que poder escolher.
Hoje, esta música, mais do que nos outros dias, ajuda-me a virar uma página.
..........................
Purple Rain - Prince
I never meant to cause you any sorrow
I never meant to cause you any pain
I only wanted one time to see you laughing
I only want to see you laughing in the purple rain
purple rain, purple rain (3x)
I only want to see you bathing in the purple rain
I never wanted to be your weekend lover
I only wanted to be some kind of friend
baby I could never steal you from another
it's such a shame our friendship had to end
purple rain, purple rain (3x)
I only want to see you underneath the purple rain
honey, I know, I know, I know times are changing
it's time we all reach out for something new, that means you too
you say you want a leader,
but you can't seem to make up your mind
I think you better close it
and let me guide you into the purple rain
purple rain, purple rain (3x)
I only want to see you, only want to see you
in the purple rain
Entretanto fiquei indecisa.
Pareceu-me que não vinha a propósito (se é que há algum propósito na escolha de uma música para um blog).
Depois, entendi que sim.
Na verdade, também sou teimosa. Dificilmente arrepio caminho.
Por isso, é mesmo Prince... com a música, com a letra, com a chuva.
Escolhas que se fazem.
Não há nada melhor do que poder escolher.
Hoje, esta música, mais do que nos outros dias, ajuda-me a virar uma página.
..........................
Purple Rain - Prince
I never meant to cause you any sorrow
I never meant to cause you any pain
I only wanted one time to see you laughing
I only want to see you laughing in the purple rain
purple rain, purple rain (3x)
I only want to see you bathing in the purple rain
I never wanted to be your weekend lover
I only wanted to be some kind of friend
baby I could never steal you from another
it's such a shame our friendship had to end
purple rain, purple rain (3x)
I only want to see you underneath the purple rain
honey, I know, I know, I know times are changing
it's time we all reach out for something new, that means you too
you say you want a leader,
but you can't seem to make up your mind
I think you better close it
and let me guide you into the purple rain
purple rain, purple rain (3x)
I only want to see you, only want to see you
in the purple rain
sábado, dezembro 03, 2005
Conciências
É certo que a maior parte das vezes que escrevo, faço-o por uma questão egoísta. Ou seja, faço-o primeiro, porque me apetece escrever (mais do que falar) e segundo, porque me apetece fazer sair o que me vai na alma. Sendo que, o verbo “apetecer” poderia ser facilmente substituído pelo “precisar”. É portanto, uma questão, perfeitamente, individualista.
A questão é, porque publico eu, algumas das coisas que escrevo, partindo do princípio que o faço levando apenas em conta, a minha vontade, a minha necessidade. Sim, porque se publico palavras que nascem das minhas emoções, vivências, até opiniões, estou obviamente a partilhá-las com quem as lê. E aqui, a ideia do par individualismo/partilha parece um contra-senso.
Já uma vez, publiquei aqui um texto que se aproximava do assunto dos dois últimos parágrafos. E na verdade a tal ideia da parede de espelhos de que nos fazemos rodear, faz-me algum sentido. É na nossa exposição que vimos os reflexos das outras pessoas. E são os reflexos das outras pessoas que frequentemente, nos consolidam o raciocínio.
Seja como for, ou porque é urgente fazer sair, ou porque é preciso tornar o raciocínio claro, ou porque apenas há necessidade de deixar registos feitos, tenho-me sentido perfeitamente egoísta a escrever.
Não é o caso deste post. Me parece. Neste, quero mesmo partilhar uma opinião. Uma vivência. Abordar um assunto sério de uma forma, sucinta e desprovida de emoções. A violência e a agressividade, sob o ponto de vista afectivo.
Sim, porque há uma violência e uma agressividade, que de afectos está desprovida. Fazer o mal, por fazer. Mas também há violência e agressividade no seio dos afectos. Em nome do amor, muita merda se faz. E, se no primeiro caso há uma leitura clara, que desencadeia uma reacção rápida e segura, já no segundo caso, o mesmo poderá não acontecer.
E quando não acontece, tudo se complica. Instala-se uma relação agressor-vitima, difícil de expirar. Muitos de nós, poderemos pensar que seria impossível sermos parte integrante de uma relação destas. Penso que a maior parte de nós, estará enganada. Basta que tudo se enquadre num qualquer contexto de permissividade e está o caos, instalado. Permite a vitima, o avanço do agressor. E permite o agressor, a passividade da vítima.
É claro que eu julgo que cada um de nós terá características dominantes, ou de vitima ou de agressor, sendo possível que nunca venha a ser nem uma, nem outra coisa. Assim, como também me parece, que os papéis poderão ser invertidos. Depende muito do contexto, de facto.
Mas conjugadas as características e o contexto, só o respeito nos salva. Ou seja, a formação de base. Aqui assenta, seguramente, o travão. O respeito pelo próximo. O respeito por nós próprios. Sendo que quem respeita muito o próximo, muitas vezes não se respeita a si próprio convenientemente. Assim como quem zela convictamente por si próprio, normalmente está a borrifar-se para os outros.
É uma teia muito relaxada, esta da efectividade de formação. Um equilíbrio difícil de consolidar. Até mesmo de construir. Por isso, falha muitas vezes, dando azo a que emirjam o agressor e a vítima. O abusador e o abusado. No seio dos afectos. Onde tudo se complica mais. Onde a permissividade é ainda maior. Na tentativa de compreender, de desculpabilizar. Atitudes há, que não se tomam por isso. Para evitar a dor, o sofrimento, o conflito. O agressor vai ganhando espaço e a vitima, encolhendo. Pode demorar anos. Pode ser fatal. Mas também se pode mudar o curso aos acontecimentos.
É preciso, antes de mais, que se reconheça o quadro. Os papeis. É preciso reter algum tempo. O tempo suficiente para que surja a primeira certeza. E depois… é preciso que se decida, não esperar mais. Esperar que os afectos normalizem, é um erro. Esperar que a situação se resolva com o tempo, é outro. Esperar que consigamos resolver a situação sozinhos, o maior de todos. É preciso tomar decisões práticas. Obviamente, quem está em melhor condição para as tomar, é a vitima. Não, porque seja a que sofre mais. Mas porque é a que tem mais ferramentas ao seu dispor. Basta ser capaz de as usar.
Falo dos tribunais. Da policia. De todas as instituições de apoio à vitima. Da família. Dos amigos. De tudo. Falo de tudo, sem excepção, aleatoriamente e sem pudor.
Ajuda-nos também o bom-senso e a concentração.
………………………………………………….
Eu pensava que o facto de não ter “espírito de vítima” era quanto bastava para nunca o ser. Pensava que o facto de ser orgulhosa, às vezes dura com as palavras, refilona quanto baste, não deixava dúvidas. Falso. Nada mais falso. Fui e ainda sou, de alguma forma, vítima de maus-tratos. E antes me tivessem algum dia, agredido fisicamente, que tinha despertado para a realidade, mais cedo do que despertei. Porque agressão, é tudo aquilo que nós permitimos que nos façam, contra a nossa vontade. E se os nossos afectos e os dos outros, são usados constantemente, como arma de arremesso, na tentativa de nos fazer aceitar aquilo que não queremos, então, não há margem para indecisões. Há que agir. Com medo, ou sem ele.
A questão é, porque publico eu, algumas das coisas que escrevo, partindo do princípio que o faço levando apenas em conta, a minha vontade, a minha necessidade. Sim, porque se publico palavras que nascem das minhas emoções, vivências, até opiniões, estou obviamente a partilhá-las com quem as lê. E aqui, a ideia do par individualismo/partilha parece um contra-senso.
Já uma vez, publiquei aqui um texto que se aproximava do assunto dos dois últimos parágrafos. E na verdade a tal ideia da parede de espelhos de que nos fazemos rodear, faz-me algum sentido. É na nossa exposição que vimos os reflexos das outras pessoas. E são os reflexos das outras pessoas que frequentemente, nos consolidam o raciocínio.
Seja como for, ou porque é urgente fazer sair, ou porque é preciso tornar o raciocínio claro, ou porque apenas há necessidade de deixar registos feitos, tenho-me sentido perfeitamente egoísta a escrever.
Não é o caso deste post. Me parece. Neste, quero mesmo partilhar uma opinião. Uma vivência. Abordar um assunto sério de uma forma, sucinta e desprovida de emoções. A violência e a agressividade, sob o ponto de vista afectivo.
Sim, porque há uma violência e uma agressividade, que de afectos está desprovida. Fazer o mal, por fazer. Mas também há violência e agressividade no seio dos afectos. Em nome do amor, muita merda se faz. E, se no primeiro caso há uma leitura clara, que desencadeia uma reacção rápida e segura, já no segundo caso, o mesmo poderá não acontecer.
E quando não acontece, tudo se complica. Instala-se uma relação agressor-vitima, difícil de expirar. Muitos de nós, poderemos pensar que seria impossível sermos parte integrante de uma relação destas. Penso que a maior parte de nós, estará enganada. Basta que tudo se enquadre num qualquer contexto de permissividade e está o caos, instalado. Permite a vitima, o avanço do agressor. E permite o agressor, a passividade da vítima.
É claro que eu julgo que cada um de nós terá características dominantes, ou de vitima ou de agressor, sendo possível que nunca venha a ser nem uma, nem outra coisa. Assim, como também me parece, que os papéis poderão ser invertidos. Depende muito do contexto, de facto.
Mas conjugadas as características e o contexto, só o respeito nos salva. Ou seja, a formação de base. Aqui assenta, seguramente, o travão. O respeito pelo próximo. O respeito por nós próprios. Sendo que quem respeita muito o próximo, muitas vezes não se respeita a si próprio convenientemente. Assim como quem zela convictamente por si próprio, normalmente está a borrifar-se para os outros.
É uma teia muito relaxada, esta da efectividade de formação. Um equilíbrio difícil de consolidar. Até mesmo de construir. Por isso, falha muitas vezes, dando azo a que emirjam o agressor e a vítima. O abusador e o abusado. No seio dos afectos. Onde tudo se complica mais. Onde a permissividade é ainda maior. Na tentativa de compreender, de desculpabilizar. Atitudes há, que não se tomam por isso. Para evitar a dor, o sofrimento, o conflito. O agressor vai ganhando espaço e a vitima, encolhendo. Pode demorar anos. Pode ser fatal. Mas também se pode mudar o curso aos acontecimentos.
É preciso, antes de mais, que se reconheça o quadro. Os papeis. É preciso reter algum tempo. O tempo suficiente para que surja a primeira certeza. E depois… é preciso que se decida, não esperar mais. Esperar que os afectos normalizem, é um erro. Esperar que a situação se resolva com o tempo, é outro. Esperar que consigamos resolver a situação sozinhos, o maior de todos. É preciso tomar decisões práticas. Obviamente, quem está em melhor condição para as tomar, é a vitima. Não, porque seja a que sofre mais. Mas porque é a que tem mais ferramentas ao seu dispor. Basta ser capaz de as usar.
Falo dos tribunais. Da policia. De todas as instituições de apoio à vitima. Da família. Dos amigos. De tudo. Falo de tudo, sem excepção, aleatoriamente e sem pudor.
Ajuda-nos também o bom-senso e a concentração.
………………………………………………….
Eu pensava que o facto de não ter “espírito de vítima” era quanto bastava para nunca o ser. Pensava que o facto de ser orgulhosa, às vezes dura com as palavras, refilona quanto baste, não deixava dúvidas. Falso. Nada mais falso. Fui e ainda sou, de alguma forma, vítima de maus-tratos. E antes me tivessem algum dia, agredido fisicamente, que tinha despertado para a realidade, mais cedo do que despertei. Porque agressão, é tudo aquilo que nós permitimos que nos façam, contra a nossa vontade. E se os nossos afectos e os dos outros, são usados constantemente, como arma de arremesso, na tentativa de nos fazer aceitar aquilo que não queremos, então, não há margem para indecisões. Há que agir. Com medo, ou sem ele.
Acabou
Rasgas-me a alma em mil pedacinhos
Que atiras ao chão.
Roubas-me o azul.
Calas-me a melodia.
Sinto o frio dos teus olhos
No fundo dos meus.
Ainda paraliso.
Ainda deixo.
Tudo de mau é possível, eu sei.
Basta um passo mais
E desarmo-te.
Antes que assim seja.
Acabou.
Que atiras ao chão.
Roubas-me o azul.
Calas-me a melodia.
Sinto o frio dos teus olhos
No fundo dos meus.
Ainda paraliso.
Ainda deixo.
Tudo de mau é possível, eu sei.
Basta um passo mais
E desarmo-te.
Antes que assim seja.
Acabou.
sexta-feira, dezembro 02, 2005
Registos
(Chegou a hora)
Tinha fugido com as crias.
Escondeu-se num buraco previamente calculado, quente e acolhedor.
Um ano e tal, a recuperar forças… escondida.
Estava na hora de sair.
Todas as forças eram precisas.
A concentração tinha que ser absoluta.
Por isso, nada mais interessa, senão uma saída em segurança.
A segunda parte de um plano que nunca existiu.
Tinha fugido com as crias.
Escondeu-se num buraco previamente calculado, quente e acolhedor.
Um ano e tal, a recuperar forças… escondida.
Estava na hora de sair.
Todas as forças eram precisas.
A concentração tinha que ser absoluta.
Por isso, nada mais interessa, senão uma saída em segurança.
A segunda parte de um plano que nunca existiu.
sábado, novembro 26, 2005
O Homem do Leme
Tudo começou assim.
Numa particular atenção à letra desta música.
(e de uma outra, que um dia destes, a seu tempo, aqui colocarei)
Tudo começou assim... num doloroso e inevitável, despertar.
Que nunca mais tem fim.
...................................
Sozinho na noite
um barco ruma para onde vai.
Uma luz no escuro brilha a direito
ofusca as demais.
E mais que uma onda, mais que uma maré...
Tentaram prendê-lo impor-lhe uma fé...
Mas, vogando à vontade, rompendo a saudade,
vai quem já nada teme, vai o homem do leme...
E uma vontade de rir nasce do fundo do ser.
E uma vontade de ir, correr o mundo e partir,
a vida é sempre a perder...
No fundo do mar
jazem os outros, os que lá ficaram.
Em dias cinzentos
descanso eterno lá encontraram.
E mais que uma onda, mais que uma maré...
Tentaram prendê-lo, impor-lhe uma fé...
Mas, vogando à vontade, rompendo a saudade,
vai quem já nada teme, vai o homem do leme...
E uma vontade de rir nasce do fundo do ser.
E uma vontade de ir, correr o mundo e partir,
a vida é sempre a perder...
No fundo horizonte
sopra o murmúrio para onde vai.
No fundo do tempo
foge o futuro, é tarde demais...
E uma vontade de rir nasce do fundo do ser.
E uma vontade de ir, correr o mundo e partir,
a vida é sempre a perder...
Numa particular atenção à letra desta música.
(e de uma outra, que um dia destes, a seu tempo, aqui colocarei)
Tudo começou assim... num doloroso e inevitável, despertar.
Que nunca mais tem fim.
...................................
Sozinho na noite
um barco ruma para onde vai.
Uma luz no escuro brilha a direito
ofusca as demais.
E mais que uma onda, mais que uma maré...
Tentaram prendê-lo impor-lhe uma fé...
Mas, vogando à vontade, rompendo a saudade,
vai quem já nada teme, vai o homem do leme...
E uma vontade de rir nasce do fundo do ser.
E uma vontade de ir, correr o mundo e partir,
a vida é sempre a perder...
No fundo do mar
jazem os outros, os que lá ficaram.
Em dias cinzentos
descanso eterno lá encontraram.
E mais que uma onda, mais que uma maré...
Tentaram prendê-lo, impor-lhe uma fé...
Mas, vogando à vontade, rompendo a saudade,
vai quem já nada teme, vai o homem do leme...
E uma vontade de rir nasce do fundo do ser.
E uma vontade de ir, correr o mundo e partir,
a vida é sempre a perder...
No fundo horizonte
sopra o murmúrio para onde vai.
No fundo do tempo
foge o futuro, é tarde demais...
E uma vontade de rir nasce do fundo do ser.
E uma vontade de ir, correr o mundo e partir,
a vida é sempre a perder...
sexta-feira, novembro 25, 2005
quarta-feira, novembro 23, 2005
Palavras
Encerram-se no meu pensamento.
Prisioneiras.
Num puro estado de individualismo.
Tem mesmo, que ser.
Prisioneiras.
Num puro estado de individualismo.
Tem mesmo, que ser.
quinta-feira, novembro 17, 2005
Encontro
Olhei para trás. Já estavam a brincar no recreio da escola.
Contentes. Tão contentes.
Saí descansada. Meti-me no carro.
Quem me dera ter estradas para correr.
Compridas. Que me levassem sem destino, para um sitio bonito.
Sozinha, no meu Nissan. Eu… e a minha música.
Ao meu encontro.
Voltava depois… daqui a dois ou três dias.
Contentes. Tão contentes.
Saí descansada. Meti-me no carro.
Quem me dera ter estradas para correr.
Compridas. Que me levassem sem destino, para um sitio bonito.
Sozinha, no meu Nissan. Eu… e a minha música.
Ao meu encontro.
Voltava depois… daqui a dois ou três dias.
Encurralado
Entre o amor, o tempo e o desamor.
Fraquejaram-me as pernas, sim. Reconheci-te, finalmente.
Encurralado.
Escorreste-me pelo rosto abaixo. Fraco.
Lamento tanto não ser capaz.
Entre o amor e o desamor… ficou o tempo. Ficaste tu.
Para sempre.
Fraquejaram-me as pernas, sim. Reconheci-te, finalmente.
Encurralado.
Escorreste-me pelo rosto abaixo. Fraco.
Lamento tanto não ser capaz.
Entre o amor e o desamor… ficou o tempo. Ficaste tu.
Para sempre.
sexta-feira, novembro 11, 2005
O grito sussurrado
Ouvi um grito lá em baixo.
Um?
Uma data deles.
Ao primeiro, sobressaltei-me. Nos seguintes, sosseguei. Depressa me convenci que eram gritos de brincadeira. Mas, por via das dúvidas, fui ver o que se passava. Ao topo das escadas, vi-o. Estava lá em baixo, à porta de saída. Rentinho ao limite que eu lhe tinha dado.
Pois… tinha acabado de lhe explicar uns minutos atrás, o que era “fora da porta” e o que era, “dentro da porta”. A porta está sempre aberta, por isso, tracei uma linha imaginária com o braço, no lugar da porta, se estivesse fechada e disse-lhe:
- Percebes? Daqui para ali é fora. Dali para aqui é dentro. E eu não te quero “fora da porta”. É a terceira vez que te digo isto, hoje.
Tive ainda o cuidado de lhe explicar o que era perder a confiança numa pessoa. Dei-lhe exemplos. Disse-lhe que não queria perder a confiança nele. Que ele, também não havia de querer que eu a perdesse. E, de facto, quando cheguei ao topo das escadas e o vi rentinho ao limite de “dentro da porta”, tive a certeza que ele tinha percebido tudo.
Fiquei bem contente. Contudo, tinha que lhe perguntar:
- Olha lá?!... para que é que tu estás a gritar assim? Pensei que te tinhas magoado.
Olhou para mim. Virou-me as costas e continuou a gritar. Desci as escadas, pois claro. Cheguei ao pé dele e sentei-me calada, no degrau de “dentro da porta”. Ele continuava a gritar. Agarrei-lhe suavemente no braço e repeti:
- Queres que as pessoas pensem que te magoaste, é? Que venham a correr ver o que se passa?
Parou de gritar, olhou para mim com o ar mais inocente deste mundo e perguntou-me:
- Vêm?
Nesta altura do campeonato, não passava uma vivalma lá fora e os outros 2 miúdos que se encontravam cá em baixo, estavam já, expectantes, quietinhos, a ver como se desenrolava a situação. Um, deitado em cima do balcão. O outro, de pé e cotovelos apoiados sobre a mesa. Ambos olhavam na nossa direcção.
Como não respondi ao “vêm?” ele deve ter entendido, que se calhar vinham mesmo. Resolveu por isso, voltar a gritar. Então, eu perguntei-lhe:
- Sabes a história do leão que gostava de pregar partidas?
Respondeu-me que não, já os olhos lhe brilhavam. Comecei a contar uma história de um leão que gostava de gritar na selva a fingir que se tinha magoado. Os outros animais, vinham todos a correr e quando chegavam junto do leão, ele ria-se e confessava que tinha acabado de pregar uma partida. Os outros animais ficavam muito zangados. Ralhavam e iam-se embora.
Não sei se nesta parte da história, se antes, se ligeiramente depois, já tinha companhia no degrau de “dentro da porta”. Os outros dois miúdos, tinham-se junto a nós, para ouvir melhor a história… digo eu. Continuei.
Então, o leão da minha história, pregou essa partida umas três ou quatro vezes. Até que um dia, magoou-se a valer e claro, gritou a pedir ajuda. Os outros animais ouviram-no, mas pensando que estivesse a brincar, não foram em seu socorro. E o leãozinho viu-se ali à rasquinha. E teve que se desenrascar sozinho.
Ficou a olhar para mim, demoradamente. Pensativo. Demorou tanto a olhar para mim, que me deu tempo para concluir que tinha consolidado a moral da história. Por isso, levantei-me como se tivesse terminado uma tarefa e preparei-me para subir as escadas. Lá em cima estavam mais sete ou oito miúdos à minha espera.
Foi quando o vi e ouvi, a sussurrar um grito, com a cabeça espreitando para “fora da porta”:
- Socorro!... ajudem-me.
Repetiu-se, sem subir o tom da voz, acompanhado por gargalhadinhas dos outros dois miúdos. Eu, continuei a subir as escadas, rezando a todos os santinhos para que não subisse o tom do grito sussurrado. Se o fizesse, eu teria que voltar a descer as escadas. Mas não saberia seguramente, como convencê-lo de que não deveria, não poderia, estar a gritar. Antes de entrar na sala de cima, olhei para trás. Já ele não sussurrava gritos. E o outro, ainda não tinha voltado a deitar-se sobre o balcão. Por isso sorri-lhes. Respirei fundo. E, entrei mesmo.
........................................
Ora bem… eu desta vez, safei-me. Mas safei-me porque o consegui sugestionar para apenas um, dos motivos que fazem as pessoas gritar. O grito de aflição. Mas também há o grito de chamar a atenção, por si só, que eu propositadamente, desviei desta situação. Vai ser uma gaita, se ele se lembrar de voltar a gritar e perceber que não tenciona pregar partida nenhuma. Como é que eu lhe hei-de explicar que não se chama a atenção das pessoas daquela maneira? Lá terei eu que inventar outra história, é o que é. O fim-de-semana vem mesmo a calhar. Dá-me tempo.
Ah!... o menino desta história, tem 7 anos, acabadinhos de fazer.
Um?
Uma data deles.
Ao primeiro, sobressaltei-me. Nos seguintes, sosseguei. Depressa me convenci que eram gritos de brincadeira. Mas, por via das dúvidas, fui ver o que se passava. Ao topo das escadas, vi-o. Estava lá em baixo, à porta de saída. Rentinho ao limite que eu lhe tinha dado.
Pois… tinha acabado de lhe explicar uns minutos atrás, o que era “fora da porta” e o que era, “dentro da porta”. A porta está sempre aberta, por isso, tracei uma linha imaginária com o braço, no lugar da porta, se estivesse fechada e disse-lhe:
- Percebes? Daqui para ali é fora. Dali para aqui é dentro. E eu não te quero “fora da porta”. É a terceira vez que te digo isto, hoje.
Tive ainda o cuidado de lhe explicar o que era perder a confiança numa pessoa. Dei-lhe exemplos. Disse-lhe que não queria perder a confiança nele. Que ele, também não havia de querer que eu a perdesse. E, de facto, quando cheguei ao topo das escadas e o vi rentinho ao limite de “dentro da porta”, tive a certeza que ele tinha percebido tudo.
Fiquei bem contente. Contudo, tinha que lhe perguntar:
- Olha lá?!... para que é que tu estás a gritar assim? Pensei que te tinhas magoado.
Olhou para mim. Virou-me as costas e continuou a gritar. Desci as escadas, pois claro. Cheguei ao pé dele e sentei-me calada, no degrau de “dentro da porta”. Ele continuava a gritar. Agarrei-lhe suavemente no braço e repeti:
- Queres que as pessoas pensem que te magoaste, é? Que venham a correr ver o que se passa?
Parou de gritar, olhou para mim com o ar mais inocente deste mundo e perguntou-me:
- Vêm?
Nesta altura do campeonato, não passava uma vivalma lá fora e os outros 2 miúdos que se encontravam cá em baixo, estavam já, expectantes, quietinhos, a ver como se desenrolava a situação. Um, deitado em cima do balcão. O outro, de pé e cotovelos apoiados sobre a mesa. Ambos olhavam na nossa direcção.
Como não respondi ao “vêm?” ele deve ter entendido, que se calhar vinham mesmo. Resolveu por isso, voltar a gritar. Então, eu perguntei-lhe:
- Sabes a história do leão que gostava de pregar partidas?
Respondeu-me que não, já os olhos lhe brilhavam. Comecei a contar uma história de um leão que gostava de gritar na selva a fingir que se tinha magoado. Os outros animais, vinham todos a correr e quando chegavam junto do leão, ele ria-se e confessava que tinha acabado de pregar uma partida. Os outros animais ficavam muito zangados. Ralhavam e iam-se embora.
Não sei se nesta parte da história, se antes, se ligeiramente depois, já tinha companhia no degrau de “dentro da porta”. Os outros dois miúdos, tinham-se junto a nós, para ouvir melhor a história… digo eu. Continuei.
Então, o leão da minha história, pregou essa partida umas três ou quatro vezes. Até que um dia, magoou-se a valer e claro, gritou a pedir ajuda. Os outros animais ouviram-no, mas pensando que estivesse a brincar, não foram em seu socorro. E o leãozinho viu-se ali à rasquinha. E teve que se desenrascar sozinho.
Ficou a olhar para mim, demoradamente. Pensativo. Demorou tanto a olhar para mim, que me deu tempo para concluir que tinha consolidado a moral da história. Por isso, levantei-me como se tivesse terminado uma tarefa e preparei-me para subir as escadas. Lá em cima estavam mais sete ou oito miúdos à minha espera.
Foi quando o vi e ouvi, a sussurrar um grito, com a cabeça espreitando para “fora da porta”:
- Socorro!... ajudem-me.
Repetiu-se, sem subir o tom da voz, acompanhado por gargalhadinhas dos outros dois miúdos. Eu, continuei a subir as escadas, rezando a todos os santinhos para que não subisse o tom do grito sussurrado. Se o fizesse, eu teria que voltar a descer as escadas. Mas não saberia seguramente, como convencê-lo de que não deveria, não poderia, estar a gritar. Antes de entrar na sala de cima, olhei para trás. Já ele não sussurrava gritos. E o outro, ainda não tinha voltado a deitar-se sobre o balcão. Por isso sorri-lhes. Respirei fundo. E, entrei mesmo.
........................................
Ora bem… eu desta vez, safei-me. Mas safei-me porque o consegui sugestionar para apenas um, dos motivos que fazem as pessoas gritar. O grito de aflição. Mas também há o grito de chamar a atenção, por si só, que eu propositadamente, desviei desta situação. Vai ser uma gaita, se ele se lembrar de voltar a gritar e perceber que não tenciona pregar partida nenhuma. Como é que eu lhe hei-de explicar que não se chama a atenção das pessoas daquela maneira? Lá terei eu que inventar outra história, é o que é. O fim-de-semana vem mesmo a calhar. Dá-me tempo.
Ah!... o menino desta história, tem 7 anos, acabadinhos de fazer.
segunda-feira, novembro 07, 2005
Chamas
quinta-feira, novembro 03, 2005
A melhor amiga dela
"oveínha"
Há 6 anos por esta hora, íamos no carro com o tio a caminho de Lisboa.
Tu ias quentinha. Eu, bem disposta. E o tio… à rasquinha.
O tio fez-nos companhia durante algum tempo, depois, mandei-o embora.
Após as peripécias habituais, as piadinhas próprias da ocasião, resolvi que eu e tu, íamos passear. Saímos dali. Não nos podíamos afastar muito, por isso, demos uma data de voltas ao quarteirão. Fartamo-nos de ver montras. Atendemos o telemóvel uma série de vezes. Bebemos até, um café.
Mais de 2 horas, seguramente. As pernas já me doíam e tu, tinhas adormecido, de certeza.
Sabes linda?... eu não estava sequer, nervosa.
Mas estava mesmo, mortinha para te ver.
Mortinha, para te sentir a pele.
Parabéns, Vera.
quarta-feira, novembro 02, 2005
Em final de ciclo
(é dela que me lembro)
Eu tinha ficado sem carro. Uma avaria. Haviam de me ir buscar. Por isso, eu esperava à beira da estrada, no sítio combinado. Aproximadamente a 12 Km da loja.
Foi quando a vi. Parecia um cão a farejar. Andava apressadamente, decididamente, à procura de qualquer coisa no chão. Do outro lado da estrada. Despertou a atenção das pessoas, que a olhavam, curiosas. Observei-a durante 2 ou 3 minutos. Dois passos para um lado, três ou quatro para o outro, mais não sei quantos noutra direcção, desenhando uma confusão de linhas num espaço pequeno de chão. Instintivamente, tentei atravessar a estrada. Não sei se para a ajudar, se para a travar. O trânsito, não me permitiu atravessar a estrada, por isso comecei a chamar-lhe a atenção. Já não me lembro como, porque nunca cheguei a saber o nome dela. Mas consegui. Ela olhou para mim. Atravessou imediatamente, correndo o risco de ser atropelada. Senti um valente aperto no coração. Mas ela escapou. De repente, já estava ao pé de mim. Satisfeita por me ver. . Cumprimentei-a com dois beijinhos. Nem disse nada sobre a travessia da estrada. Perguntei-lhe apenas se tinha perdido alguma coisa. Respondeu-me que não, que andava apenas, à procura de rolhas de cortiça. Nem me atrevi a perguntar-lhe para quê, nem porquê, naquele sítio à beira de uma estrada movimentada e barulhenta. Não havia sinal nenhum, de que naquele lugar, pudessem haver rolhas de cortiça espalhadas pelo chão.
Preocupei-me. Como tinha ela chegado ali. Como voltaria para casa. Tinha vindo a pé, disse-me. E voltaria, também. Costumava fazer aquelas caminhadas, explicou-me. Saía de casa de madrugada e andava até ao meio do dia. Nessa altura, voltava para trás, por forma a regressar a casa, ao final da tarde. Salientou que tinha que ser até ao final da tarde, para a mãe não se preocupar.
Começou a contar-me despropositadamente, episódios de vida de uma mulher e do filho desta. A desilusão, quase traição que lhe fez sentir. O sofrimento que lhe causou. Usava um vocabulário rico, que não combinava com a boca dela, desprovida de vários dentes, com aquele aspecto tão simples, quase desleixado. Eu ouvia-a com atenção, mas não conseguia abstrair-me da preocupação que me causava. Queria perguntar-lhe se tinha comido. Se tinha dinheiro. Não fui capaz. Interrompia-a só, volta e meia, quando parava o seu discurso para respirar e me dava oportunidade para intervir. Tentava convencê-la a voltar comigo. Em vão.
Chegou entretanto a minha boleia. Forcei-a a calar-se, prendendo-lhe as mãos. Insisti quase desesperadamente, para que voltasse comigo. A minha boleia, estava a empatar o trânsito e eu tentava convencê-la. Desisti quando ela me fez uma festinha no rosto e com um olhar terno, fixado nos meus olhos, me disse:
- Não se preocupe comigo. Vá. Eu fico bem.
Aquele olhar e aquela frase, pareceu-me um poiso breve, breve, na realidade. Um desvio rápido, de um caminho delirante, alucinante. Não sei se acreditei que ficava bem, mas as insistentes buzinadelas do trânsito, fizeram-me desistir. Beijei-a novamente, despedindo-me. Ainda lhe perguntei se tinha a certeza. Acenou afirmativamente com a cabeça e conseguiu manter o olhar terno, até eu virar costas. Esta fora a terceira vez, que a tinha visto.
A primeira foi quando me entrou pela loja adentro, rápida e decidida. Travou o andar à minha frente, logo a seguir à porta e perguntou-me se podia ver. Respondi-lhe que sim, obviamente, que estivesse à vontade. Dirigiu-se imediatamente a uma das estantes, como se soubesse exactamente o que procurava. E, em movimentos rápidos e precisos, agarrou em três peças, enquanto dizia:
- Isto, isto e isto.
Poisou as peças sobre o balcão e perguntou-me se as podia guardar. Que voltaria a seguir ao almoço para as ir buscar e pagar. Era um pequeno vaso de barro, uma jarra branca de loiça e uma pequena peça em cristal com a figura de três macacos, cada um tapando respectivamente, os olhos, a boca e os ouvidos, na simbologia de “não ver, não falar e não ouvir”.
Da mesma maneira que entrou, saiu. Rápida e apressadamente. Deixando-me a pensar. Tinha sido uma aparição pouco comum. Ela própria, invulgar. Cabelos grisalhos e rebeldes, nem compridos, nem curtos. Camisa axadrezada aberta, por cima de uma qualquer t-shirt e por fora das calças de ganga. Sapatos rasos. Franzina. Muito magra, mesmo. Aparentemente, entre os 40 e os 50 anos.
Não voltou, nesse dia a seguir ao almoço, nem nas duas, três semanas a seguir. Mas eu não me atrevi a voltar a expor as peças que me pediu para guardar. Algo me dizia que ela voltava. E eu estava certa. Voltou, sim. Como se não tivesse passado tempo nenhum, senão o combinado. Cumprimentou-me, simpática. Retirou uma nota dobrada do bolso das calças, mais umas moedas e disse-me:
- Venho buscar as minhas peças.
Embrulhei as peças. Fiz a conta. O dinheiro que ela me tinha antecipadamente, posto em cima do balcão, estava certo com a conta que tinha a pagar. Acho que franzi a testa, impressionada, mas nem disse nada. Como é que aquela mulher fixou o preço das coisas, numa entrada e numa escolha tão rápidas? Como é que ela não se tinha esquecido do valor exacto, que nem redondo era, ao final daquele tempo todo? Fiquei com a nítida sensação que ela tinha andado a juntar dinheiro. E que finalmente junto, poderia ir buscar as coisas que queria.
Agradeceu e ia a sair. Mas voltou para trás. Ainda bem que o fez. Porque nos momentos seguintes, aquela mulher proporcionou-me um prazer imenso. Só de a ouvir falar. Falou de crianças de uma forma perfeitamente hipnotizante. Fazendo-me acreditar que já teria sido professora, educadora, qualquer destas actividades relacionadas com crianças. Concordei com tudo o que disse. Parecia que estava a ouvir o meu próprio pensamento, injectado por uma melhor capacidade de raciocínio. Fazia uma escolha de palavras correcta, adequada, elaborada. Não vacilava nunca, como se de um texto decorado se tratasse.
Depois falou de plantas, e flores. Falou do Sol também, e da sua luz. Só lhe interessava o dia, enquanto houvesse luz. Preferia dormir, durante o escuro, à espera que o Sol nascesse outra vez. Eu estava perfeitamente deliciada com aquela mulher, com aquele discurso. Pouco ou nada disse. Era um crime interrompe-la. Contou também alguns episódios da vida dela, relacionados com familiares, com amigos. Contou-me como se nos conhecêssemos há algum tempo. Sem pudor. Só parou de falar e saiu da loja, quando entrou outra cliente.
Voltei a vê-la depois, passado semanas, nesse tal dia em que o meu carro avariou, à beira da estrada, à procura de rolhas de cortiça, no chão.
A última vez que a vi, foi na semana passada. Entrou na loja tão apressadamente que me assustei. Mais uma vez, decidida. Como se tivesse saído de casa, para ir à loja , propositadamente. Desta vez, percebi logo que não ia comprar nada, porque começou imediatamente a falar. Eu estava a trabalhar e parei para a ouvir. Desta vez, intervi mais. Desta vez, foi mais uma conversa do que um monólogo. Percebi finalmente, que aquela mulher já tinha sido profissionalmente, activa. Mas não, na área que eu julgava. Percebi também que vivia há dez, doze anos, uma doença do foro neurológico. Fazia tratamento. Finalmente fazia tratamento, porque tal como me disse, tinha andado anos, sem querer tomar os comprimidos. Um disparate, admitia. E durante esses anos, em que não quis tomar os comprimidos, viveu em posição fetal, sobre um sofá. Levantava-se apenas, para ir à casa de banho, para beber água e comer colheradas de mel. Lá comia mais qualquer coisa, sempre líquidos, quando a mãe a conseguia convencer.
- Eu não queria viver, mas tinha um instinto de sobrevivência muito grande. ‘Tá a ver?... água e mel. Eu era só pele e osso, mas nunca mais morria. Por isso resolvi começar a tomar os comprimidos e olhe… ainda aqui ando.
Voltou a falar da tal mulher e do filho desta. Da desilusão que lhe causou, fazendo-me pensar que tal desilusão, teria sido contributo para tamanha tristeza e desinteresse pela vida. Intuí também, pelas palavras dela, que teria porventura, uma orientação sexual diferente da minha. Que aquela criança de que falava, era como se fosse filha dela. Que a privação à criança, a que a tinham sujeito, a fazia sofrer ainda. Eu ia fazendo uma pergunta aqui e ali, à qual ela respondia prontamente. O meu interesse naquela conversa, nas palavras dela, era imenso. Por isso fiquei desiludida, quando percebi que repentinamente, tinha decidido ir-se embora. A despedida foi rápida. Mas, chegada à porta, ela voltou atrás e disse-me:
- Esses seus olhos são Sóis.
Saiu logo a seguir. Arrepiei-me toda. Dei a volta ao balcão e corri atrás dela até à porta, chamando-a. Ela voltou atrás. Eu precisava de dizer uma coisa. E entendi que ela precisava de a ouvir.
- Oiça – disse eu - Eu quero-lhe dizer uma coisa. Da próxima vez que você cá voltar, eu já não devo cá estar. Vou deixar a loja. Vou trabalhar para outro sítio. Mas… queria que soubesse uma coisa. De todas as pessoas que aqui conheci, você foi a que me tocou mais. Queria só que soubesse isto.
Os olhos dela humedeceram, imediatamente. O nariz avermelhou. Olhou para mim durante uns segundos. Não disse nada. Deu-me um abraço apertado, demorado, ao qual eu correspondi, e virou costas rapidamente. Fiquei a observá-la. Seguia caminho a passo apressado. Cabeça baixa. Nas mãos levava um pequeno molho de flores, que eu tinha no chão da loja, junto ao caixote e que teriam ido para o lixo, se ela não mas tivesse pedido, a determinada altura da conversa.
………………………………………………………
Cada vez me convenço mais, que basta um passo em falso, uma particular característica, um enorme desgosto, eu sei lá… para que qualquer um de nós, possa resvalar para fora de um padrão de comportamento dito normalizado. Mas a verdade, é que todas as pessoas que tenho encontrado neste meu percurso pela vida, desenquadradas deste tal padrão dito normalizado, são pessoas interessantíssimas. Fortes, sensíveis e sobreviventes. Despertam definitivamente, a minha atenção.
Eu tinha ficado sem carro. Uma avaria. Haviam de me ir buscar. Por isso, eu esperava à beira da estrada, no sítio combinado. Aproximadamente a 12 Km da loja.
Foi quando a vi. Parecia um cão a farejar. Andava apressadamente, decididamente, à procura de qualquer coisa no chão. Do outro lado da estrada. Despertou a atenção das pessoas, que a olhavam, curiosas. Observei-a durante 2 ou 3 minutos. Dois passos para um lado, três ou quatro para o outro, mais não sei quantos noutra direcção, desenhando uma confusão de linhas num espaço pequeno de chão. Instintivamente, tentei atravessar a estrada. Não sei se para a ajudar, se para a travar. O trânsito, não me permitiu atravessar a estrada, por isso comecei a chamar-lhe a atenção. Já não me lembro como, porque nunca cheguei a saber o nome dela. Mas consegui. Ela olhou para mim. Atravessou imediatamente, correndo o risco de ser atropelada. Senti um valente aperto no coração. Mas ela escapou. De repente, já estava ao pé de mim. Satisfeita por me ver. . Cumprimentei-a com dois beijinhos. Nem disse nada sobre a travessia da estrada. Perguntei-lhe apenas se tinha perdido alguma coisa. Respondeu-me que não, que andava apenas, à procura de rolhas de cortiça. Nem me atrevi a perguntar-lhe para quê, nem porquê, naquele sítio à beira de uma estrada movimentada e barulhenta. Não havia sinal nenhum, de que naquele lugar, pudessem haver rolhas de cortiça espalhadas pelo chão.
Preocupei-me. Como tinha ela chegado ali. Como voltaria para casa. Tinha vindo a pé, disse-me. E voltaria, também. Costumava fazer aquelas caminhadas, explicou-me. Saía de casa de madrugada e andava até ao meio do dia. Nessa altura, voltava para trás, por forma a regressar a casa, ao final da tarde. Salientou que tinha que ser até ao final da tarde, para a mãe não se preocupar.
Começou a contar-me despropositadamente, episódios de vida de uma mulher e do filho desta. A desilusão, quase traição que lhe fez sentir. O sofrimento que lhe causou. Usava um vocabulário rico, que não combinava com a boca dela, desprovida de vários dentes, com aquele aspecto tão simples, quase desleixado. Eu ouvia-a com atenção, mas não conseguia abstrair-me da preocupação que me causava. Queria perguntar-lhe se tinha comido. Se tinha dinheiro. Não fui capaz. Interrompia-a só, volta e meia, quando parava o seu discurso para respirar e me dava oportunidade para intervir. Tentava convencê-la a voltar comigo. Em vão.
Chegou entretanto a minha boleia. Forcei-a a calar-se, prendendo-lhe as mãos. Insisti quase desesperadamente, para que voltasse comigo. A minha boleia, estava a empatar o trânsito e eu tentava convencê-la. Desisti quando ela me fez uma festinha no rosto e com um olhar terno, fixado nos meus olhos, me disse:
- Não se preocupe comigo. Vá. Eu fico bem.
Aquele olhar e aquela frase, pareceu-me um poiso breve, breve, na realidade. Um desvio rápido, de um caminho delirante, alucinante. Não sei se acreditei que ficava bem, mas as insistentes buzinadelas do trânsito, fizeram-me desistir. Beijei-a novamente, despedindo-me. Ainda lhe perguntei se tinha a certeza. Acenou afirmativamente com a cabeça e conseguiu manter o olhar terno, até eu virar costas. Esta fora a terceira vez, que a tinha visto.
A primeira foi quando me entrou pela loja adentro, rápida e decidida. Travou o andar à minha frente, logo a seguir à porta e perguntou-me se podia ver. Respondi-lhe que sim, obviamente, que estivesse à vontade. Dirigiu-se imediatamente a uma das estantes, como se soubesse exactamente o que procurava. E, em movimentos rápidos e precisos, agarrou em três peças, enquanto dizia:
- Isto, isto e isto.
Poisou as peças sobre o balcão e perguntou-me se as podia guardar. Que voltaria a seguir ao almoço para as ir buscar e pagar. Era um pequeno vaso de barro, uma jarra branca de loiça e uma pequena peça em cristal com a figura de três macacos, cada um tapando respectivamente, os olhos, a boca e os ouvidos, na simbologia de “não ver, não falar e não ouvir”.
Da mesma maneira que entrou, saiu. Rápida e apressadamente. Deixando-me a pensar. Tinha sido uma aparição pouco comum. Ela própria, invulgar. Cabelos grisalhos e rebeldes, nem compridos, nem curtos. Camisa axadrezada aberta, por cima de uma qualquer t-shirt e por fora das calças de ganga. Sapatos rasos. Franzina. Muito magra, mesmo. Aparentemente, entre os 40 e os 50 anos.
Não voltou, nesse dia a seguir ao almoço, nem nas duas, três semanas a seguir. Mas eu não me atrevi a voltar a expor as peças que me pediu para guardar. Algo me dizia que ela voltava. E eu estava certa. Voltou, sim. Como se não tivesse passado tempo nenhum, senão o combinado. Cumprimentou-me, simpática. Retirou uma nota dobrada do bolso das calças, mais umas moedas e disse-me:
- Venho buscar as minhas peças.
Embrulhei as peças. Fiz a conta. O dinheiro que ela me tinha antecipadamente, posto em cima do balcão, estava certo com a conta que tinha a pagar. Acho que franzi a testa, impressionada, mas nem disse nada. Como é que aquela mulher fixou o preço das coisas, numa entrada e numa escolha tão rápidas? Como é que ela não se tinha esquecido do valor exacto, que nem redondo era, ao final daquele tempo todo? Fiquei com a nítida sensação que ela tinha andado a juntar dinheiro. E que finalmente junto, poderia ir buscar as coisas que queria.
Agradeceu e ia a sair. Mas voltou para trás. Ainda bem que o fez. Porque nos momentos seguintes, aquela mulher proporcionou-me um prazer imenso. Só de a ouvir falar. Falou de crianças de uma forma perfeitamente hipnotizante. Fazendo-me acreditar que já teria sido professora, educadora, qualquer destas actividades relacionadas com crianças. Concordei com tudo o que disse. Parecia que estava a ouvir o meu próprio pensamento, injectado por uma melhor capacidade de raciocínio. Fazia uma escolha de palavras correcta, adequada, elaborada. Não vacilava nunca, como se de um texto decorado se tratasse.
Depois falou de plantas, e flores. Falou do Sol também, e da sua luz. Só lhe interessava o dia, enquanto houvesse luz. Preferia dormir, durante o escuro, à espera que o Sol nascesse outra vez. Eu estava perfeitamente deliciada com aquela mulher, com aquele discurso. Pouco ou nada disse. Era um crime interrompe-la. Contou também alguns episódios da vida dela, relacionados com familiares, com amigos. Contou-me como se nos conhecêssemos há algum tempo. Sem pudor. Só parou de falar e saiu da loja, quando entrou outra cliente.
Voltei a vê-la depois, passado semanas, nesse tal dia em que o meu carro avariou, à beira da estrada, à procura de rolhas de cortiça, no chão.
A última vez que a vi, foi na semana passada. Entrou na loja tão apressadamente que me assustei. Mais uma vez, decidida. Como se tivesse saído de casa, para ir à loja , propositadamente. Desta vez, percebi logo que não ia comprar nada, porque começou imediatamente a falar. Eu estava a trabalhar e parei para a ouvir. Desta vez, intervi mais. Desta vez, foi mais uma conversa do que um monólogo. Percebi finalmente, que aquela mulher já tinha sido profissionalmente, activa. Mas não, na área que eu julgava. Percebi também que vivia há dez, doze anos, uma doença do foro neurológico. Fazia tratamento. Finalmente fazia tratamento, porque tal como me disse, tinha andado anos, sem querer tomar os comprimidos. Um disparate, admitia. E durante esses anos, em que não quis tomar os comprimidos, viveu em posição fetal, sobre um sofá. Levantava-se apenas, para ir à casa de banho, para beber água e comer colheradas de mel. Lá comia mais qualquer coisa, sempre líquidos, quando a mãe a conseguia convencer.
- Eu não queria viver, mas tinha um instinto de sobrevivência muito grande. ‘Tá a ver?... água e mel. Eu era só pele e osso, mas nunca mais morria. Por isso resolvi começar a tomar os comprimidos e olhe… ainda aqui ando.
Voltou a falar da tal mulher e do filho desta. Da desilusão que lhe causou, fazendo-me pensar que tal desilusão, teria sido contributo para tamanha tristeza e desinteresse pela vida. Intuí também, pelas palavras dela, que teria porventura, uma orientação sexual diferente da minha. Que aquela criança de que falava, era como se fosse filha dela. Que a privação à criança, a que a tinham sujeito, a fazia sofrer ainda. Eu ia fazendo uma pergunta aqui e ali, à qual ela respondia prontamente. O meu interesse naquela conversa, nas palavras dela, era imenso. Por isso fiquei desiludida, quando percebi que repentinamente, tinha decidido ir-se embora. A despedida foi rápida. Mas, chegada à porta, ela voltou atrás e disse-me:
- Esses seus olhos são Sóis.
Saiu logo a seguir. Arrepiei-me toda. Dei a volta ao balcão e corri atrás dela até à porta, chamando-a. Ela voltou atrás. Eu precisava de dizer uma coisa. E entendi que ela precisava de a ouvir.
- Oiça – disse eu - Eu quero-lhe dizer uma coisa. Da próxima vez que você cá voltar, eu já não devo cá estar. Vou deixar a loja. Vou trabalhar para outro sítio. Mas… queria que soubesse uma coisa. De todas as pessoas que aqui conheci, você foi a que me tocou mais. Queria só que soubesse isto.
Os olhos dela humedeceram, imediatamente. O nariz avermelhou. Olhou para mim durante uns segundos. Não disse nada. Deu-me um abraço apertado, demorado, ao qual eu correspondi, e virou costas rapidamente. Fiquei a observá-la. Seguia caminho a passo apressado. Cabeça baixa. Nas mãos levava um pequeno molho de flores, que eu tinha no chão da loja, junto ao caixote e que teriam ido para o lixo, se ela não mas tivesse pedido, a determinada altura da conversa.
………………………………………………………
Cada vez me convenço mais, que basta um passo em falso, uma particular característica, um enorme desgosto, eu sei lá… para que qualquer um de nós, possa resvalar para fora de um padrão de comportamento dito normalizado. Mas a verdade, é que todas as pessoas que tenho encontrado neste meu percurso pela vida, desenquadradas deste tal padrão dito normalizado, são pessoas interessantíssimas. Fortes, sensíveis e sobreviventes. Despertam definitivamente, a minha atenção.
segunda-feira, outubro 31, 2005
Vontade
Traço um caminho comprido.
E vou percorrendo a medo.
E nesse caminho comprido que percorro a medo, estás tu.
Teimo. Acredito. Continuo.
Surda.
Finalmente, surda.
Por isso, escolhi.
Fui eu que escolhi, percorrer este caminho comprido.
Mesmo, que o faça a medo
E vou percorrendo a medo.
E nesse caminho comprido que percorro a medo, estás tu.
Teimo. Acredito. Continuo.
Surda.
Finalmente, surda.
Por isso, escolhi.
Fui eu que escolhi, percorrer este caminho comprido.
Mesmo, que o faça a medo
domingo, outubro 16, 2005
sábado, outubro 08, 2005
domingo, outubro 02, 2005
terça-feira, setembro 27, 2005
segunda-feira, setembro 26, 2005
sábado, setembro 24, 2005
Hora do chá
Definitivamente... antes e depois.
Finalmente, tenho música no blog.
REM - Everybody Hurts
When the day is long ... and the night
the night is yours alone
when you think you've had enough... of this life, well hang on.
Don't let yourself go
cause everybody cries
and everybody hurts... sometimes.
Sometimes everything is wrong.
Now it's time to sing along.
When your day is night alone (hold on, hold on)
if you feel like letting go (hold on)
when you're sure you've had too much... of this life, well hang
on.
cause everybody hurts... sometimes
Take comfort in your friends
Everybody hurts.
Don't throw your hand. Oh, no.
Don't throw your hand.
If you feel like you're alone,
no, no, no, you're not alone
If you're on your own... in this life,
the days and nights are long
when you sure you've had too much ... of this life, to hang
on.
Well, everybody hurts sometimes, everybody cries.
Sometimes
And everybody hurts ... sometimes.
And everybody hurts sometimes. So, hold on, hold on.
Hold on, hold on. Hold on, hold on. Hold on, hold on.
Everybody hurts. You are not alone.
Finalmente, tenho música no blog.
REM - Everybody Hurts
When the day is long ... and the night
the night is yours alone
when you think you've had enough... of this life, well hang on.
Don't let yourself go
cause everybody cries
and everybody hurts... sometimes.
Sometimes everything is wrong.
Now it's time to sing along.
When your day is night alone (hold on, hold on)
if you feel like letting go (hold on)
when you're sure you've had too much... of this life, well hang
on.
cause everybody hurts... sometimes
Take comfort in your friends
Everybody hurts.
Don't throw your hand. Oh, no.
Don't throw your hand.
If you feel like you're alone,
no, no, no, you're not alone
If you're on your own... in this life,
the days and nights are long
when you sure you've had too much ... of this life, to hang
on.
Well, everybody hurts sometimes, everybody cries.
Sometimes
And everybody hurts ... sometimes.
And everybody hurts sometimes. So, hold on, hold on.
Hold on, hold on. Hold on, hold on. Hold on, hold on.
Everybody hurts. You are not alone.
sexta-feira, setembro 23, 2005
quinta-feira, setembro 15, 2005
Consegues resistir-lhe?
(dedicado a uma grande amiga)
(já não sei onde fui buscar esta imagem)
Já não te lembras como é bonito, pois não?
É essa nuvem negra, por cima de ti.
Já quase não te vejo, amiga.
E tu... não consegues ver mais nada.
Mas, eu garanto-te que existe.
É verdade. O Sol continua a aparecer todos os dias.
Amanhece, todos os dias.
Garanto-te que vais conseguir reparar nele, outra vez.
Sentir-te-às agradecida... viva, de novo.
Mantem-te firme.
(já não sei onde fui buscar esta imagem)
Já não te lembras como é bonito, pois não?
É essa nuvem negra, por cima de ti.
Já quase não te vejo, amiga.
E tu... não consegues ver mais nada.
Mas, eu garanto-te que existe.
É verdade. O Sol continua a aparecer todos os dias.
Amanhece, todos os dias.
Garanto-te que vais conseguir reparar nele, outra vez.
Sentir-te-às agradecida... viva, de novo.
Mantem-te firme.
sexta-feira, setembro 09, 2005
O Terceiro Técnico
O alarme da loja deu sinais de alterado funcionamento. Liguei para a empresa. Falei com o dono. Expliquei-lhe os sintomas.
- Não deve ser nada grave – concluiu.
Insisti. Não queria correr o risco do alarme disparar durante a noite. Dez minutos de viagem. Mais meia hora para conseguir acordar os miúdos e metê-los no carro (que em casa é que os não deixava, sozinhos). Quando finalmente chegasse à loja, já a vila inteira estava acordada.
Compreendeu o quadro. Voluntariou-se a confirmar os sintomas. Concordou comigo que seria alguma coisa com a bateria. O alarme só dispararia se faltasse a energia.
- Oh, diabo! – pensei – É a coisa mais fácil de acontecer. Basta que chova (aqui na província é assim).
Lá o consegui convencer que a resolução do problema não podia esperar até há manhã seguinte. Os dois técnicos responsáveis pela zona estavam longe. Havia um outro, mas…
Deduzi que algum motivo haveria, para não ser este Terceiro Técnico, preferencialmente enviado ao local. Afinal, era o que estava disponível. Contudo, não me quedei muito nesse assunto, já que apesar de alguma coisa, a decisão de o enviar foi tomada.
Tinha que esperar. Esperei. Esperei. Para trás e para a frente, na loja. Não sei quantos cigarros fumados. Pessoas à minha espera em casa. Resolvi ir até à porta. Não havia movimento, nem de carros, nem de pessoas. Estava quase na hora do jantar. E eu, queria ir embora.
Ao princípio da rua, avistei um carro branco. Aproximou-se a uma velocidade louca. Reconheci o logótipo da empresa. Como não dava sinal de afrouxamento, acenei. Ainda bem que não havia ninguém na rua. Juro que me envergonhei com a ensurdecedora travagem que o Terceiro Técnico obrigou o carro a fazer. Fez uma marcha-atrás tão rápida e tão indiscreta como a travagem. Estacionou à primeira, e saiu do carro como se nada se tivesse passado. Simpático, cumprimentou-me. Um aperto de mão frouxo. Surpreendeu-me. Um homem decidido não aperta assim a mão e ele, tinha-me parecido um homem decidido, ou pelo menos de reflexos rápidos.
Perguntei-lhe se sabia ao que vinha. Disse-me que não. Ok. Tive que explicar tudo de novo. Rematei com a suspeição de que seria um problema de bateria. Afinal, o sinal Bat, acendia, a par com o som intermitente.
- Bateria? Não – respondeu-me convicto.
- Não? – Perguntei, admirada. Se ainda nem tinha visto o sistema, como poderia estar tão certo?
Ficou a olhar para o aparelho o tempo suficiente, para me fazer começar a entender a renitência do envio deste Terceiro Técnico. Vociferava monossílabos imperceptíveis. E nada fazia. Eu estava pasmada.
Começou a palpar os bolsos todos. Tinha muitos. Quase parecia uma qualquer coreografia de dança, de um qualquer desses estilos musicais bem ritmados. Era o telemóvel que procurava. Lá o encontrou. As perguntas que fez ao colega, que segundo pareceu estava de férias, eram básicas. Dignas de serem feitas por mim própria, que não percebo patavina de sistemas de alarme. Juro que não conseguia tirar os olhos de cima do homem. Abismada.
As perguntas que fez, as respostas que obteve, de pouco adiantaram. Continuava sem saber o que fazer. Pareceu-me uma eternidade o tempo em que se deixou ficar à frente do equipamento, repetindo exactamente, que não sabia o que fazer.
Ao final de não sei quanto tempo, lá consegui eu, soltar algumas palavras. Insisti na bateria. E ele insistiu que não. Perguntou-me se podia desligar o quadro eléctrico.
- Faça favor – respondi.
- Faça alguma coisa – acrescentei, pensando.
Depois da experiência feita, explicou-me porque não podia ser da bateria. Atrevi-me a argumentar (tinha que me atrever a alguma coisa, senão não saíamos dali)
que podia, antes de descarregar completamente, dar sinal disso mesmo. Afinal, era o que vinha fazendo. Dava um sinal, periodicamente.
Imediatamente após o meu argumento, vejo novamente o Terceiro Técnico a palpar os bolsos. Todos. Mais um telefonema.
- Olha lá!... isto não pode dar sinal antes de descarregar completamente? – foi a pergunta que ele fez. Eu olhava para ele, boquiaberta.
Bom… lá resolveu que tinha que abrir o bloco. Finalmente. Foi ao carro buscar a caixa das ferramentas. Voltou e pousou-a no chão, entre as pernas, encostada à extremidade da montra, o que lhe aumentou consideravelmente a distância de acesso ao equipamento. As pernas abertas também não ajudavam muito ao equilíbrio. Não sei quantas vezes, deu um passo atrás, e baixou-se à procura da chave certa. De todas as vezes que o fez, permitiu-me que visse o fundo das suas costas… peludas. Invulgarmente peludas.
O espanto que aquele Terceiro Técnico me causava, não havia meio de cessar. Tive mesmo que me encostar ao balcão, depois de o ouvir dizer:
- Ah!... É a bateria.
Como se tivesse feito uma descoberta genial. Não disse, mas se o ouvisse a acrescentar, “só podia ser”, juro que já não me surpreendia.
Admiro o empregador deste Terceiro Técnico. Há pessoas bondosas. Merecem mesmo, o céu.
- Não deve ser nada grave – concluiu.
Insisti. Não queria correr o risco do alarme disparar durante a noite. Dez minutos de viagem. Mais meia hora para conseguir acordar os miúdos e metê-los no carro (que em casa é que os não deixava, sozinhos). Quando finalmente chegasse à loja, já a vila inteira estava acordada.
Compreendeu o quadro. Voluntariou-se a confirmar os sintomas. Concordou comigo que seria alguma coisa com a bateria. O alarme só dispararia se faltasse a energia.
- Oh, diabo! – pensei – É a coisa mais fácil de acontecer. Basta que chova (aqui na província é assim).
Lá o consegui convencer que a resolução do problema não podia esperar até há manhã seguinte. Os dois técnicos responsáveis pela zona estavam longe. Havia um outro, mas…
Deduzi que algum motivo haveria, para não ser este Terceiro Técnico, preferencialmente enviado ao local. Afinal, era o que estava disponível. Contudo, não me quedei muito nesse assunto, já que apesar de alguma coisa, a decisão de o enviar foi tomada.
Tinha que esperar. Esperei. Esperei. Para trás e para a frente, na loja. Não sei quantos cigarros fumados. Pessoas à minha espera em casa. Resolvi ir até à porta. Não havia movimento, nem de carros, nem de pessoas. Estava quase na hora do jantar. E eu, queria ir embora.
Ao princípio da rua, avistei um carro branco. Aproximou-se a uma velocidade louca. Reconheci o logótipo da empresa. Como não dava sinal de afrouxamento, acenei. Ainda bem que não havia ninguém na rua. Juro que me envergonhei com a ensurdecedora travagem que o Terceiro Técnico obrigou o carro a fazer. Fez uma marcha-atrás tão rápida e tão indiscreta como a travagem. Estacionou à primeira, e saiu do carro como se nada se tivesse passado. Simpático, cumprimentou-me. Um aperto de mão frouxo. Surpreendeu-me. Um homem decidido não aperta assim a mão e ele, tinha-me parecido um homem decidido, ou pelo menos de reflexos rápidos.
Perguntei-lhe se sabia ao que vinha. Disse-me que não. Ok. Tive que explicar tudo de novo. Rematei com a suspeição de que seria um problema de bateria. Afinal, o sinal Bat, acendia, a par com o som intermitente.
- Bateria? Não – respondeu-me convicto.
- Não? – Perguntei, admirada. Se ainda nem tinha visto o sistema, como poderia estar tão certo?
Ficou a olhar para o aparelho o tempo suficiente, para me fazer começar a entender a renitência do envio deste Terceiro Técnico. Vociferava monossílabos imperceptíveis. E nada fazia. Eu estava pasmada.
Começou a palpar os bolsos todos. Tinha muitos. Quase parecia uma qualquer coreografia de dança, de um qualquer desses estilos musicais bem ritmados. Era o telemóvel que procurava. Lá o encontrou. As perguntas que fez ao colega, que segundo pareceu estava de férias, eram básicas. Dignas de serem feitas por mim própria, que não percebo patavina de sistemas de alarme. Juro que não conseguia tirar os olhos de cima do homem. Abismada.
As perguntas que fez, as respostas que obteve, de pouco adiantaram. Continuava sem saber o que fazer. Pareceu-me uma eternidade o tempo em que se deixou ficar à frente do equipamento, repetindo exactamente, que não sabia o que fazer.
Ao final de não sei quanto tempo, lá consegui eu, soltar algumas palavras. Insisti na bateria. E ele insistiu que não. Perguntou-me se podia desligar o quadro eléctrico.
- Faça favor – respondi.
- Faça alguma coisa – acrescentei, pensando.
Depois da experiência feita, explicou-me porque não podia ser da bateria. Atrevi-me a argumentar (tinha que me atrever a alguma coisa, senão não saíamos dali)
que podia, antes de descarregar completamente, dar sinal disso mesmo. Afinal, era o que vinha fazendo. Dava um sinal, periodicamente.
Imediatamente após o meu argumento, vejo novamente o Terceiro Técnico a palpar os bolsos. Todos. Mais um telefonema.
- Olha lá!... isto não pode dar sinal antes de descarregar completamente? – foi a pergunta que ele fez. Eu olhava para ele, boquiaberta.
Bom… lá resolveu que tinha que abrir o bloco. Finalmente. Foi ao carro buscar a caixa das ferramentas. Voltou e pousou-a no chão, entre as pernas, encostada à extremidade da montra, o que lhe aumentou consideravelmente a distância de acesso ao equipamento. As pernas abertas também não ajudavam muito ao equilíbrio. Não sei quantas vezes, deu um passo atrás, e baixou-se à procura da chave certa. De todas as vezes que o fez, permitiu-me que visse o fundo das suas costas… peludas. Invulgarmente peludas.
O espanto que aquele Terceiro Técnico me causava, não havia meio de cessar. Tive mesmo que me encostar ao balcão, depois de o ouvir dizer:
- Ah!... É a bateria.
Como se tivesse feito uma descoberta genial. Não disse, mas se o ouvisse a acrescentar, “só podia ser”, juro que já não me surpreendia.
Admiro o empregador deste Terceiro Técnico. Há pessoas bondosas. Merecem mesmo, o céu.
quinta-feira, setembro 08, 2005
A importância dos afectos
- Oh, Mãe!... sabes qual foi a prrofessorra (pois… carrega um bocadinho nos “res”) que mais gostei até hoje?
- Não – respondei, fartinha de saber – diz lá.
- Foi a prrofessorra (eheh…) Rosa.
- Ai, é? Então porquê? (era suposto querer saber).
- Então… porque de todas as prrofessorras que tive, esta foi a que gostou mais de mim.
Já tivemos esta conversa dezenas de vezes. Penso sempre a mesma coisa. É curioso o motivo pelo qual ela preferiu a “prrofessorra” Rosa. Não foi porque era a mais gira, nem porque era a mais divertida. Tão-pouco por ter sido a mais liberal ou pelo contrário, a mais regrada. Foi mesmo, porque foi a que lhe conseguiu mostrar maior afecto. A importância dos afectos, nas nossas vidas. Insuflam-nos a auto-estima. Fortalecem-nos. Marcam-nos para a vida toda.
- Não – respondei, fartinha de saber – diz lá.
- Foi a prrofessorra (eheh…) Rosa.
- Ai, é? Então porquê? (era suposto querer saber).
- Então… porque de todas as prrofessorras que tive, esta foi a que gostou mais de mim.
Já tivemos esta conversa dezenas de vezes. Penso sempre a mesma coisa. É curioso o motivo pelo qual ela preferiu a “prrofessorra” Rosa. Não foi porque era a mais gira, nem porque era a mais divertida. Tão-pouco por ter sido a mais liberal ou pelo contrário, a mais regrada. Foi mesmo, porque foi a que lhe conseguiu mostrar maior afecto. A importância dos afectos, nas nossas vidas. Insuflam-nos a auto-estima. Fortalecem-nos. Marcam-nos para a vida toda.
quarta-feira, setembro 07, 2005
Anjo da guarda
terça-feira, setembro 06, 2005
sábado, setembro 03, 2005
Conversas
Sou danada para conversar. Aquelas conversas que não têm fim. São apenas, interrompidas pelo cansaço, sendo sempre possível serem retomadas, assim haja oportunidade para isso.
Obviamente, nem com toda a gente, se consegue manter este tipo de conversa. Terão que ser, tal como eu, pessoas resistentes. De preferência de opinião contrária à minha. Não há nada mais maçador do que a permanente concordância.
Penso contudo, que a troca de argumentos, até mesmo o confronto com eles desenvolvido, não passa disso mesmo. Longe vai o tempo, se alguma vez o vivi, em que tinha a ilusão, a pretensão, de convencer alguém com os meus argumentos.
É verdade que em tempos de adolescência, havia certos temas que não conseguia discutir, sem que me brilhassem demais os olhos, sem que a minha voz se mantivesse sempre, abaixo do nível do enfurecimento. Cheguei mesmo a abandonar certos temas de conversa, durante alguns anos. Mas foram eles, somados uns em cima dos outros, que me fizeram compreender que as discussões, as trocas de argumentos, de opiniões, em que me envolvo, não pretendem mudar nada. Eu sei isso.
Ai de mim, se a seguir a uma conversa, me não mantivesse à mesma no Benfica, não continuasse a ser crente em coisíssima nenhuma, trocasse as minhas calças de ganga por saias travadas, deixasse de aceitar a diferença, ou não pudesse continuar a dizer aquilo que desejo quando a isso me disponho.
Pelo-me por uma boa conversa, sim. Daquelas que me mantenham acordada. Daquelas que se desenvolvem mutuamente, atravessando a troca de argumentos, mas que nunca tenham termo com a expressão: Pois, mas eu não quero ou não gosto, assim. É que só nessa altura, percebo que eu sei que não pretendo mudar nada, mas a pessoa com quem converso, não sabe, nem quer saber. Torna-se por isso, o confronto, desigual. E eu perco a capacidade de argumentar.
Há coisas que têm que mudar, sim. Sobretudo aspectos de carácter social. E sobre esses também é preciso discutir, pois claro. Promover e consolidar a formação. Mas isso é um trabalho moroso em termos de resultado. E é outro assunto.
Obviamente, nem com toda a gente, se consegue manter este tipo de conversa. Terão que ser, tal como eu, pessoas resistentes. De preferência de opinião contrária à minha. Não há nada mais maçador do que a permanente concordância.
Penso contudo, que a troca de argumentos, até mesmo o confronto com eles desenvolvido, não passa disso mesmo. Longe vai o tempo, se alguma vez o vivi, em que tinha a ilusão, a pretensão, de convencer alguém com os meus argumentos.
É verdade que em tempos de adolescência, havia certos temas que não conseguia discutir, sem que me brilhassem demais os olhos, sem que a minha voz se mantivesse sempre, abaixo do nível do enfurecimento. Cheguei mesmo a abandonar certos temas de conversa, durante alguns anos. Mas foram eles, somados uns em cima dos outros, que me fizeram compreender que as discussões, as trocas de argumentos, de opiniões, em que me envolvo, não pretendem mudar nada. Eu sei isso.
Ai de mim, se a seguir a uma conversa, me não mantivesse à mesma no Benfica, não continuasse a ser crente em coisíssima nenhuma, trocasse as minhas calças de ganga por saias travadas, deixasse de aceitar a diferença, ou não pudesse continuar a dizer aquilo que desejo quando a isso me disponho.
Pelo-me por uma boa conversa, sim. Daquelas que me mantenham acordada. Daquelas que se desenvolvem mutuamente, atravessando a troca de argumentos, mas que nunca tenham termo com a expressão: Pois, mas eu não quero ou não gosto, assim. É que só nessa altura, percebo que eu sei que não pretendo mudar nada, mas a pessoa com quem converso, não sabe, nem quer saber. Torna-se por isso, o confronto, desigual. E eu perco a capacidade de argumentar.
Há coisas que têm que mudar, sim. Sobretudo aspectos de carácter social. E sobre esses também é preciso discutir, pois claro. Promover e consolidar a formação. Mas isso é um trabalho moroso em termos de resultado. E é outro assunto.
quinta-feira, setembro 01, 2005
Preciso de ver os miúdos
Pareceu-me tão ridículo ouvir a minha voz a dizer isto.
Mas, disse. Voltava a dizer. Se não me tivessem feito a vontade, imediatamente.
A sério que penso… que estou convencida, que o aspecto mais difícil de suportar em consequência à separação com o pai dos meus filhos, é mesmo a partilha dos mesmos. 1 mês de férias com o pai. É perfeitamente insuportável. Mais uma semana que fosse e rebentava comigo. Estou por um fio. O termo certo é mesmo: desesperante.
É evidente que esta verificação me fez pensar. O estado a que cheguei, ao final de um mês, assusta-me. Tento analisar a questão de uma forma fria, resoluta e útil, tentando evitar futuros danos. Obviamente, não consigo. Conseguirei certamente, a pouco e pouco.
Há contudo, uma conclusão que já vinha fazendo e que salta logo à vista. A minha dependência. O facto de não me conseguir sentir bem, sem que isso dependa de outras pessoas. Desagrada-me tanto esta verificação. Faz-me sentir frágil. Tão frágil que nem me acanho a pedir ajuda.
Mais uma vez, o meu pensamento corre para uma imagem. Um filme, neste caso. Monster’s Ball – Depois do ódio. É tão efémera a força. É tão possível passar de um estado resistente para a fragilidade. Basta apenas que aconteça uma coisa: um abanão nos nossos pilares.
Reconhecer isto, com humildade, com verdade, mas sem auto comiseração, parece-me difícil, mas absolutamente necessário para a recuperação dos nossos pilares. Para de um estado frágil, voltar a enfortecer. Mais. Absolutamente fundamental, para que nos possamos defender de futuros abanões.
A grande questão, aqui, no meu ponto de vista, nesta que tento construir, é a possibilidade do reforço dos pilares, sem que o mesmo, dependa de mais ninguém, senão de nós próprios. Será isso, possível? Conseguiremos nós, defender-nos de uma forma tão auto-suficiente, vivendo rodeados de tanta gente? E se o conseguirmos, não correremos o risco de prescindir do relacionamento com os outros, de tão auto-suficientes nos tornarmos? Não correremos nós, o risco de construir um mundo só nosso?
Mais uma vez, a virtude estará no meio-termo. Mas, qual?
Curiosamente, há umas semanas atrás, em conversa com uma miúda tranquila com a vida, verifiquei que na opinião dela, o segredo está na generosidade. Se vivermos num estado de generosidade, de abertura, com o próximo, com a vida, connosco próprios, vivemos tranquilos. Pareceu-me tão inteligente aquela afirmação. Fez todo o sentido, na altura. Depois vi o filme, do qual retirei uma mensagem idêntica. Li ainda, umas coisas que escrevi há uns tempos atrás. E construí uma quase convicção: Se nos construirmos sobre esse tal estado de graça, de generosidade e nos orientarmos em função dos outros e do bem-estar que lhes conseguirmos proporcionar, se sairmos de nós próprios e das nossas necessidades, atingimos a liberdade absoluta. Faz sentido. Todo o sentido. Se não temos necessidades, sentimo-nos confortáveis.
A “quase convicção” cai por terra, com a maior das facilidades, quando afinal, me oiço a dizer: Preciso de ver os miúdos. Quando afinal percebo que não consigo sair de mim e das minhas necessidades. Será talvez, uma questão de persistência. Talvez não seja fácil. Talvez haja um caminho a percorrer.
Mas, disse. Voltava a dizer. Se não me tivessem feito a vontade, imediatamente.
A sério que penso… que estou convencida, que o aspecto mais difícil de suportar em consequência à separação com o pai dos meus filhos, é mesmo a partilha dos mesmos. 1 mês de férias com o pai. É perfeitamente insuportável. Mais uma semana que fosse e rebentava comigo. Estou por um fio. O termo certo é mesmo: desesperante.
É evidente que esta verificação me fez pensar. O estado a que cheguei, ao final de um mês, assusta-me. Tento analisar a questão de uma forma fria, resoluta e útil, tentando evitar futuros danos. Obviamente, não consigo. Conseguirei certamente, a pouco e pouco.
Há contudo, uma conclusão que já vinha fazendo e que salta logo à vista. A minha dependência. O facto de não me conseguir sentir bem, sem que isso dependa de outras pessoas. Desagrada-me tanto esta verificação. Faz-me sentir frágil. Tão frágil que nem me acanho a pedir ajuda.
Mais uma vez, o meu pensamento corre para uma imagem. Um filme, neste caso. Monster’s Ball – Depois do ódio. É tão efémera a força. É tão possível passar de um estado resistente para a fragilidade. Basta apenas que aconteça uma coisa: um abanão nos nossos pilares.
Reconhecer isto, com humildade, com verdade, mas sem auto comiseração, parece-me difícil, mas absolutamente necessário para a recuperação dos nossos pilares. Para de um estado frágil, voltar a enfortecer. Mais. Absolutamente fundamental, para que nos possamos defender de futuros abanões.
A grande questão, aqui, no meu ponto de vista, nesta que tento construir, é a possibilidade do reforço dos pilares, sem que o mesmo, dependa de mais ninguém, senão de nós próprios. Será isso, possível? Conseguiremos nós, defender-nos de uma forma tão auto-suficiente, vivendo rodeados de tanta gente? E se o conseguirmos, não correremos o risco de prescindir do relacionamento com os outros, de tão auto-suficientes nos tornarmos? Não correremos nós, o risco de construir um mundo só nosso?
Mais uma vez, a virtude estará no meio-termo. Mas, qual?
Curiosamente, há umas semanas atrás, em conversa com uma miúda tranquila com a vida, verifiquei que na opinião dela, o segredo está na generosidade. Se vivermos num estado de generosidade, de abertura, com o próximo, com a vida, connosco próprios, vivemos tranquilos. Pareceu-me tão inteligente aquela afirmação. Fez todo o sentido, na altura. Depois vi o filme, do qual retirei uma mensagem idêntica. Li ainda, umas coisas que escrevi há uns tempos atrás. E construí uma quase convicção: Se nos construirmos sobre esse tal estado de graça, de generosidade e nos orientarmos em função dos outros e do bem-estar que lhes conseguirmos proporcionar, se sairmos de nós próprios e das nossas necessidades, atingimos a liberdade absoluta. Faz sentido. Todo o sentido. Se não temos necessidades, sentimo-nos confortáveis.
A “quase convicção” cai por terra, com a maior das facilidades, quando afinal, me oiço a dizer: Preciso de ver os miúdos. Quando afinal percebo que não consigo sair de mim e das minhas necessidades. Será talvez, uma questão de persistência. Talvez não seja fácil. Talvez haja um caminho a percorrer.
sábado, agosto 27, 2005
Wonderful Tonight
Fecho-me, envolta numa magia que queria acreditar, não ser só minha… de cada vez que a oiço. Uma viagem acetinada que me permite o deslumbramento de uma paisagem perfeitamente anestesiante. Demoro a voltar a mim e nunca fico na mesma.
Há pessoas mágicas, sim.
Esfumaço a pouco e pouco… de saudades do Sol.
E das noites em que me sentia lindamente.
Há pessoas mágicas, sim.
Esfumaço a pouco e pouco… de saudades do Sol.
E das noites em que me sentia lindamente.
quinta-feira, agosto 25, 2005
Bom dia
- Bom dia, para ti também, meu amor.
Palavras que não se dizem.
Parecem-me hoje, as mais fáceis de entender.
Ensinaram à minha filha de 5 anos a dizer “bom dia” em linguagem gestual. De há quase 1 ano a esta parte, todos os dias me deseja um bom dia e uma boa noite, nesta linguagem. Tornou-se um ritual, nosso. Usa sempre a mesma expressão, o mesmo olhar. Chama-me sempre a atenção antes, com uma palavra: mãe. Eu olho para ela. Ela faz o gesto em silêncio. Elegantemente. Sorrio sempre. Ela gosta.
Agora, que não está comigo, é por telefone.
- Mãe!... agora faz silêncio. Vou fazer aquilo que tu gostas.
- Ok. Faz lá.
...
- Bom dia, para ti também, meu amor.
Palavras que não se dizem.
Parecem-me hoje, as mais fáceis de entender.
Palavras que não se dizem.
Parecem-me hoje, as mais fáceis de entender.
Ensinaram à minha filha de 5 anos a dizer “bom dia” em linguagem gestual. De há quase 1 ano a esta parte, todos os dias me deseja um bom dia e uma boa noite, nesta linguagem. Tornou-se um ritual, nosso. Usa sempre a mesma expressão, o mesmo olhar. Chama-me sempre a atenção antes, com uma palavra: mãe. Eu olho para ela. Ela faz o gesto em silêncio. Elegantemente. Sorrio sempre. Ela gosta.
Agora, que não está comigo, é por telefone.
- Mãe!... agora faz silêncio. Vou fazer aquilo que tu gostas.
- Ok. Faz lá.
...
- Bom dia, para ti também, meu amor.
Palavras que não se dizem.
Parecem-me hoje, as mais fáceis de entender.
sábado, julho 16, 2005
Sombra
Vagueio descalça sem rumo
À espera que o tempo passe
Atenta, expectante, ansiosa,
Aguardo que um caminho se trace
Salpicando um céu azul, grandioso
Chovem pétalas de rosas.
Mandou-mas o Sol.
Descem leves, luminosas
Mas o chão está na sombra
De pétalas não se cobriu
Frio, frio… debaixo dos meus pés nus
A ordem não se cumpriu
Rasgo o tempo, enfurecida
Caminho sempre em frente
Não me deixo agarrar
Noutro abraço doce e quente
À espera que o tempo passe
Atenta, expectante, ansiosa,
Aguardo que um caminho se trace
Salpicando um céu azul, grandioso
Chovem pétalas de rosas.
Mandou-mas o Sol.
Descem leves, luminosas
Mas o chão está na sombra
De pétalas não se cobriu
Frio, frio… debaixo dos meus pés nus
A ordem não se cumpriu
Rasgo o tempo, enfurecida
Caminho sempre em frente
Não me deixo agarrar
Noutro abraço doce e quente
sábado, julho 02, 2005
Mentira
- Ò mãe!... qual é a coisa mais feia do mundo?
- A coisa mais feia do mundo?
Sei lá. Acho que é desmanchar. Desmanchar uma pessoa, uma imagem, uma verdade. A coisa mais feia do mundo, é a falta de escrúpulos, de valores, que permite esse desmanche. Sem propósito nobre. Sequer, sem propósito algum.
Queres saber também, quais são as pessoas de quem menos gosto, neste mundo? Os chicos-espertos. Aqueles que pensam que sabem mais que os outros. Que se convencem absolutamente disso. Que não percebem que apenas são capazes de fazer aquilo que os outros são incapazes, por uma questão de princípio, de formação, de respeito pelo próximo.
Ainda te posso dizer, qual foi a fase da minha vida que menos gostei de viver, neste mundo. Na verdade, ainda não a vivi. Começo agora, a viver. É a fase em que tenho que me confrontar com o maior dos chicos-espertos. A quem não posso virar costas. É a fase em que vou ter que me reduzir ao mesmo nível deles, dos chicos-espertos, sob pena de me poderem desmanchar.
Era uma resposta muito complicada, por isso, respondi-lhe apenas que a coisa mais feia do mundo… é a mentira.
domingo, junho 19, 2005
Abençoada
Numa doce e fresca penumbra, senti-as como um beijo suave a despertar-me. Na verdade, já tinha ouvido o sino em sinal de chamamento que ignoro sempre como tal, mas prezo como se fosse meu.
Às 11.30 h, de Domingo, toca sempre. Toca de forma diferente, anunciando a missa. Chamando os seus fieis, onde não me encontro, dos quais não faço parte. Mas prezo. Prezo este sino, como se meu fosse.
Na verdade, já o tinha ouvido, há meia hora atrás, quando me beijaram aquelas vozes celestiais. Foi quando despertei. Finalmente despertei. Com as vozes do coro da igreja. Um doce despertar. Perto. Próximo. Um verdadeiro abraço abençoado. Ontem à noite fechei as portadas. Abri as janelas. Deitei-me na cama mais próxima. E, fiz muito bem.
Por cima dos lençóis brancos, frescos… protegida pela penumbra das paredes iluminadas aqui e ali pelos recortes das portadas… hoje, fui suavemente beijada por vozes celestiais. Sem me mexer, adivinhei o ritual. A imensa porta da igreja aberta de par em par, a entrada do padre, dos cónegos, da cruz.
Reconheci a voz dela, por entre as outras vozes do coro. Mais um anjo, na minha vida. Neste sim, eu acredito. É ela que toma conta dos meus filhos.
Levantei-me antes de sentir a imensa porta da igreja, fechar. Antes que elas parassem de cantar. Retive o momento e fiz o registo.
domingo, junho 12, 2005
Um ano
Faz amanhã 1 ano que publiquei o primeiro post neste blog.
Pouco tempo depois, deixei de viver com o pai dos meus filhos.
Desisti da minha casa.
Dei baixa da minha actividade profissional.
Perdi o sentido de humor.
Fui perdendo a compulsividade para a palavra escrita.
E… já nem me apetece escrever sobre gajos.
Ao final de quase 1 ano, luto pela sobrevivência.
Esforço-me por manter um emprego precário.
Defendo até à exaustão, o bem-estar dos meus filhos.
Resisto à malvadez.
E ainda não me dei por vencida.
Restou apenas a minha individualidade.
Pela integridade dela, mudei o rumo à minha vida.
E, apesar de por vezes, a sentir frágil como qualquer ser vivo, recém-nascido… parece-me que vou vingar.
...................................
Desculpem-me meus amigos, que sei do fraco interesse que os meus posts têm suscitado. A falta de animação continuará assim nos próximos tempos. Melhores dias virão, estou certa disso.
Lanço os meus braços, num abraço grande, a todos vocês.
Miúda!... tenho saudades tuas, aqui.
Pouco tempo depois, deixei de viver com o pai dos meus filhos.
Desisti da minha casa.
Dei baixa da minha actividade profissional.
Perdi o sentido de humor.
Fui perdendo a compulsividade para a palavra escrita.
E… já nem me apetece escrever sobre gajos.
Ao final de quase 1 ano, luto pela sobrevivência.
Esforço-me por manter um emprego precário.
Defendo até à exaustão, o bem-estar dos meus filhos.
Resisto à malvadez.
E ainda não me dei por vencida.
Restou apenas a minha individualidade.
Pela integridade dela, mudei o rumo à minha vida.
E, apesar de por vezes, a sentir frágil como qualquer ser vivo, recém-nascido… parece-me que vou vingar.
...................................
Desculpem-me meus amigos, que sei do fraco interesse que os meus posts têm suscitado. A falta de animação continuará assim nos próximos tempos. Melhores dias virão, estou certa disso.
Lanço os meus braços, num abraço grande, a todos vocês.
Miúda!... tenho saudades tuas, aqui.
sábado, maio 21, 2005
Crisálida
sexta-feira, maio 20, 2005
terça-feira, maio 17, 2005
segunda-feira, maio 16, 2005
terça-feira, maio 10, 2005
Ò mãe!...
(de papel e lápis na mão…)
- Ò mãe!... se eu fosse uma inventora de animais, sabes que animal é que inventava?
- Diz lá, filha.
Começou a desenhar. Rápida. Segura no traço.
Fiquei a observar atentamente.
Esta minha filha tem essa capacidade. Prende-me a atenção como ninguém.
Fez dois animais. Um, parecia um balão prestes a rebentar. Deve ter sido por isso que lhe arranjou 2 narizes, para respirar melhor, dizia ela. Lembrei-me: Foi por causa da conversa da asma do Professor João, só pode. O outro, parecia um laçarote. Uma espécie de sapo com asas. Será que os sapos gostariam de voar? Isto também fui eu a pensar, não foi ela.
Seja como for… Tenho três. Revejo-me nesta em todos os aspectos. Mesmo todos. A preocupação é tentar dar-lhe espaço. Porque a tendência, porra!... é impedir que ela abra portas que eu fiz mal em ter aberto. Digo eu. Eu, que até tenho a mania que nunca me arrependo de nada. Mas lá que me fartei de fazer porcaria, fartei. Tenho mesmo que lhe dar espaço. Quem sabe, a miúda até pode vir a ter mais juízo que eu.
segunda-feira, maio 09, 2005
Lembras-te, Gasolim?
Solidão
Há o conceito de não ter ninguém por perto. Porque se mora sozinho. Porque se está muito tempo sozinho. Não interessa. Esta solidão conheço mal. Raramente me acontece. Por isso mesmo, esfrego as mãos de contente, quando me encontro realmente sozinha, isto é, sem ninguém por perto. Aproveito para escrever. Aproveito para ouvir música a 20 db. Dançar. Cantar. Ou simplesmente deitar-me sossegada. Depende do que me apetece fazer. Depende também das minhas obrigações, ou seja, das tarefas que me competem e que tenho em atraso.
A solidão a que me refiro, é outra. É fácil surgirem-me imagens dela. Difícil é conceitua-la. Mas acho que consigo, se me valer das imagens também.
Deitamo-nos ao lado de alguém que nos é íntimo (marido ou mulher, pais, filhos, irmãos, amigos ou amigas, não interessa) e ao invés de nos sentirmos simplesmente confortados, sentimo-nos igualmente sozinhos. O conforto vem apenas da sugestão de companhia e mais fisicamente, do próprio leito. Esta foi a primeira imagem.
Num grupo de amigos, ou até mesmo só com uma pessoa, há uma conversa animada. Saímo-nos bem. Tivemos piada. A conversa foi interessante. Entretanto acabou. Ficamos sozinhos. E, se nos olharmos a um espelho, não vemos satisfação. Vemos solidão. Caiu a máscara. Mas só depois de estarmos sozinhos. Está foi a segunda imagem.
Ou seja, solidão é falta de partilha. Partilha efectiva. E quanto mais gente temos, mais frustrados nos sentimos. Porque com nenhuma das pessoas fossos capazes de partilhar. Com nenhuma das pessoas desarmamos. Com nenhuma das pessoas fomos capazes de tirar a máscara. Porquê? Porque não encontrámos em ninguém capacidade de descobrir. De querer ver para além da máscara. Ou pior ainda… de descobrir e de ver para além de… e simplesmente não aceitar. As pessoas não se aceitam como são. Aceitam-se conforme é conveniente. Conveniente socialmente. Conveniente em relação ao próprio conceito de razoabilidade ou normalidade. Conveniente para não arranjarmos problemas com e para os outros (quantas vezes não partilhamos, apenas para não preocupar as pessoas). Por isso surgem os segredinhos. As coisas inconfessáveis. A máscara cada vez mais espessa, menos identificável. E o verdadeiro eu, fica escondido cá bem no fundo. Só nós próprios nos encontramos com ele. Este é o meu verdadeiro conceito de solidão. E… estou farta de estar sozinha. E quanto mais falo, mais escrevo, mais canto ou danço, mais grito a minha solidão. Ela própria… mascarada. Solidão é portanto, a nossa própria individualidade. Aquela que não conseguimos partilhar com ninguém.
Escrito a 31.07.2004
Há o conceito de não ter ninguém por perto. Porque se mora sozinho. Porque se está muito tempo sozinho. Não interessa. Esta solidão conheço mal. Raramente me acontece. Por isso mesmo, esfrego as mãos de contente, quando me encontro realmente sozinha, isto é, sem ninguém por perto. Aproveito para escrever. Aproveito para ouvir música a 20 db. Dançar. Cantar. Ou simplesmente deitar-me sossegada. Depende do que me apetece fazer. Depende também das minhas obrigações, ou seja, das tarefas que me competem e que tenho em atraso.
A solidão a que me refiro, é outra. É fácil surgirem-me imagens dela. Difícil é conceitua-la. Mas acho que consigo, se me valer das imagens também.
Deitamo-nos ao lado de alguém que nos é íntimo (marido ou mulher, pais, filhos, irmãos, amigos ou amigas, não interessa) e ao invés de nos sentirmos simplesmente confortados, sentimo-nos igualmente sozinhos. O conforto vem apenas da sugestão de companhia e mais fisicamente, do próprio leito. Esta foi a primeira imagem.
Num grupo de amigos, ou até mesmo só com uma pessoa, há uma conversa animada. Saímo-nos bem. Tivemos piada. A conversa foi interessante. Entretanto acabou. Ficamos sozinhos. E, se nos olharmos a um espelho, não vemos satisfação. Vemos solidão. Caiu a máscara. Mas só depois de estarmos sozinhos. Está foi a segunda imagem.
Ou seja, solidão é falta de partilha. Partilha efectiva. E quanto mais gente temos, mais frustrados nos sentimos. Porque com nenhuma das pessoas fossos capazes de partilhar. Com nenhuma das pessoas desarmamos. Com nenhuma das pessoas fomos capazes de tirar a máscara. Porquê? Porque não encontrámos em ninguém capacidade de descobrir. De querer ver para além da máscara. Ou pior ainda… de descobrir e de ver para além de… e simplesmente não aceitar. As pessoas não se aceitam como são. Aceitam-se conforme é conveniente. Conveniente socialmente. Conveniente em relação ao próprio conceito de razoabilidade ou normalidade. Conveniente para não arranjarmos problemas com e para os outros (quantas vezes não partilhamos, apenas para não preocupar as pessoas). Por isso surgem os segredinhos. As coisas inconfessáveis. A máscara cada vez mais espessa, menos identificável. E o verdadeiro eu, fica escondido cá bem no fundo. Só nós próprios nos encontramos com ele. Este é o meu verdadeiro conceito de solidão. E… estou farta de estar sozinha. E quanto mais falo, mais escrevo, mais canto ou danço, mais grito a minha solidão. Ela própria… mascarada. Solidão é portanto, a nossa própria individualidade. Aquela que não conseguimos partilhar com ninguém.
Escrito a 31.07.2004
domingo, maio 08, 2005
Palmadinhas nas costas
Muitas.
Tantas.
Atropeladas.
Alucinadas.
Dadas por todas as mãos.
Mãos sinceras.
Olhar sorridente.
Tudo embrulhado num som estridente de alegria, de festa, de azáfama.
No fim… desmontaram-se os palcos.
O meu… o outro…
Entrei no carro.
Fiquei sozinha.
Questionei-me:
Qual o valor das palmadinhas nas costas?
Estarei a ficar amarga? Mal agradecida?
Porra!... tenho que deixar de pensar tanto.
Tantas.
Atropeladas.
Alucinadas.
Dadas por todas as mãos.
Mãos sinceras.
Olhar sorridente.
Tudo embrulhado num som estridente de alegria, de festa, de azáfama.
No fim… desmontaram-se os palcos.
O meu… o outro…
Entrei no carro.
Fiquei sozinha.
Questionei-me:
Qual o valor das palmadinhas nas costas?
Estarei a ficar amarga? Mal agradecida?
Porra!... tenho que deixar de pensar tanto.
quarta-feira, março 23, 2005
O Sol
A propósito deste comentário da Fia, apeteceu-me publicar este post.
"Eu reconheço imensas coisas em mim que não me foram ensinadas, tão pouco vieram de pais...há coisas que não se conseguem explicar...só sentir...Mãe babadona...Bijo"
Separaste bem. As coisas que nos são ensinadas e as que herdamos genéticamente. Por vezes não são coincidentes. Não me perguntes porquê, nunca tive conversas com o meu filho, mas a verdade, é que ambos temos um interesse muito particular pelo Sol. Ambos gostamos de escrever histórias sobre ele. Eu já escrevi várias e ele nunca as leu. Tens razão. Há coisas que não se conseguem explicar... só sentir. Quanto à mãe babadona... Ora vê...
Era uma vez o Sol que encontrou uma nuvem.
A nuvem pôs-se à frente do Sol.
O Sol disse:
- Podes sair da minha frente?
- Não - Respondeu a nuvem.
- Porquê?
- Porque não quero sair da frente - Voltou a dizer a nuvem.
- Ai, é? Então já te mostro - Disse o Sol.
Chamou o seu amigo vento e pediu-lhe que afastasse a nuvem.
O vento soprou forte e a nuvem saiu da frente do Sol.
E assim, o Sol continuou a brilhar.
(escrito pelo meu filho, aos 9 anos de idade)
Havemos de lá chegar
(dedicado ao meu filho)
Voltei.
Da avaliação da escola.
Com a emoção à flor da pele.
Não almocei.
Mais de uma hora a falar sobre ti, com a tua professora.
Li as tuas composições. As tuas auto-avaliações.
Emocionei-me vezes sem conta.
É sempre assim, eu sei.
Mas a intensidade é grande. Não é um momento qualquer.
Da avaliação da escola.
Com a emoção à flor da pele.
Não almocei.
Mais de uma hora a falar sobre ti, com a tua professora.
Li as tuas composições. As tuas auto-avaliações.
Emocionei-me vezes sem conta.
É sempre assim, eu sei.
Mas a intensidade é grande. Não é um momento qualquer.
Nem só uma avaliação a ti. Eu própria, sou sempre posta em questão.
De um sopro só, sem uma palavra, dava tudo por um abraço teu.
Eu sei que te esforças. Conheço a tua fragilidade.
Sinto-me pequenina. Impotente.
Mas filho, havemos de lá chegar.
Não estou desiludida, não. Nunca.
Adoro a forma como cativas as pessoas.
Como as incentivas a acompanharem-te. Como as mobilizas.
É um dom que tu tens, que eu não te ensinei.
Mérito próprio.
Havemos de lá chegar.
De um sopro só, sem uma palavra, dava tudo por um abraço teu.
Eu sei que te esforças. Conheço a tua fragilidade.
Sinto-me pequenina. Impotente.
Mas filho, havemos de lá chegar.
Não estou desiludida, não. Nunca.
Adoro a forma como cativas as pessoas.
Como as incentivas a acompanharem-te. Como as mobilizas.
É um dom que tu tens, que eu não te ensinei.
Mérito próprio.
Havemos de lá chegar.
terça-feira, março 22, 2005
Oficial e Cavalheiro
Do filme, pois.
Não vou fazer nenhuma crítica ao filme.
É apenas um registo, que volta e meia, vem… e vai… e torna.
É apenas o registo… do maior desengano da minha vida.
Vi o filme, não sei… com 18, 19 anos… já não faço ideia.
Era romântica, demasiado romântica, e acreditava que entre o homem e a mulher existia uma espécie de engrenagem que punha tudo a mexer.
O exemplo do meu pai e da minha mãe, tinham contribuído para este conceito de quase perfeição. Não era sequer um conceito de família. Era mesmo o conceito de união. Inevitável. Uma espécie de metamorfose, só que entre dois seres.
Estava tão certa disso, que o final do filme me comoveu. O final feliz, quero dizer. Afinal, o rapaz tinha compreendido. Finalmente, tinha compreendido… a ideia da metamorfose. Rendeu-se. Voltou. E, metamorfoseou-se. Ela claro, mais esperta, já tinha percebido. Foi difícil convencê-lo. Fazê-lo acreditar. Mas, lá conseguiu. Por isso o final foi feliz. A música… ah!... a música… acho que me fazia acreditar em qualquer coisa.
Ao longo do tempo, ao longo dos anos… esse filme tem-me acompanhado. Volta e meia, levo com ele pela frente. Entra-me pela casa adentro, através da televisão… invade-me o pensamento, através do registo que deixou. Entretanto, um registo de mutação. De uma mutação terrivelmente triste, na qual não gosto habitualmente, de pensar.
Afinal, em que acreditava eu? Eu, enquanto mulher. Que existia algures um homem, que havia de ser meu, no sentido em que juntos, nos metamorfoseávamos dando origem a uma união colorida e plena de luz? Numa visão mágica, sim. Numa mais romântica, seria um homem que me deixasse simplesmente, ser. Finalmente, de regresso à realidade, seria um homem que compreendesse tão bem como eu a individualidade de cada um de nós. Que a compreendesse, a considerasse e fizesse como eu, uso dela.
Hoje. Justamente, hoje, não é assim que penso. Ou talvez seja, já não tenho é esperança de viver um amor assim. E não é sequer pela idade que tenho. É mesmo pela constatação da dificuldade no acerto. É como encontrar uma agulha num palheiro. Não é o homem. É mesmo a metamorfose. A incompatibilidade não dá origem à união. À tal união, que me pareceu ter encontrado no meu pai e na minha mãe. Sem esforço. Simplesmente, engrenável. Incondicional.
Hoje. Justamente, hoje, percebi finalmente, que é precisamente por não saber viver o amor de outra forma, que decidi não viver nenhum.
Mas preciso de aprender. Aprender como se vive o amor de uma forma mais leve, menos vitalícia. Tenho que ensinar as minhas filhas, o meu filho. Porque, colocada a fasquia muito alta, é difícil depois, dar a volta por cima. O desengano é muito doloroso.
Já vi “Oficial e cavalheiro” não sei quantas vezes. Confesso que não gosto de o ver. Parece-me desonesto, do tipo “publicidade enganosa”. Mas, fico sempre à espera do fim. E… quando começa a música, quando começo a ouvir Joe Cocker, quando o rapaz entra por ali adentro… as minhas pernas perdem força, o meu queixo treme, aos meus olhos chegam as lágrimas. Comovo-me sériamente. Mas, nunca deixo que ninguém se aperceba.
Hoje teve que sair.
Desculpem.
Dizer tudo como os malucos.
sábado, março 19, 2005
Mais uma viagem
(desta vez, mais curta... leve... esvoaçante...)
Desci a escadas apressadamente, como de costume, com a mochila e a pasta. Abri a porta do carro, do lado oposto ao do condutor e atirei com as duas lá para dentro. Deixei a porta aberta e voltei a correr. Subo as escadas. Pego no cpu que já tinha previamente colocado no topo das escadas e desço novamente, desta vez com o cuidado necessário, para não me espetar ao comprido.
Encafuei o cpu aos pés do banco. Fecho a porta e dou a volta ao carro. Procuro a chave no bolso das calças e quando vou a abrir a porta… lá estava ele, 5 cm acima da fechadura, imóvel, contudo assustador. Era verde… ou seria castanho? Imenso. Olhos grandes. Pernas compridas. Acho que lhe vi uma língua bifurcada a espreitar. Fumo a sair pelas narinas. Mas… estava imóvel.
Porra!... pensei. O que é que eu faço?
Não tinha muito tempo para pensar, devido ao atraso de 10 minutos com que já estava, de maneira que agi inconscientemente (às vezes é a forma mais eficaz de agir). Devagarinho, meti a chave na fechadura e retirei imediatamente a mão. Não se mexeu.
Porreiro!... voltei a pensar. Vamos à segunda parte do plano inconsciente. Rodar a chave e abrir a porta.
Assim fiz, mantendo o corpo, o mais distante possível da porta. Entrei. Bati a porta rapidamente e olhei. Mantinha-se imóvel, sem pestanejar. Apenas me parecia ver a língua bifurcada e o fumo a sair pelas narinas, como único sinal de vida.
Caraças!... é obstinado. E agora? Não posso abrir a janela. Logo, não posso fumar. Filho-da-mãe. Bom!... nada de mais. Acendo o cigarro mais tarde, quando ele resolver sair… soltar-se… cair?!... sei lá…
Sigo viagem. Curta. Apenas 7 a 10 minutos. Faço a primeira curva. Faço a segunda curva. Olho pelo retrovisor. Continuava lá.
Chiça!... teimoso do caraças. Espera lá que eu já te digo. Vou entrar na recta.
Apanho a recta. 90 km/h.
Olho para o retrovisor. Ainda lá estava.
100 Km/h. Continua.
Vou empurrando o pedal com firmeza.
110 Km/h. Porra!... Ainda aí estás?!...
Tento observá-lo pelo retrovisor, atentamente, tanto quanto me é possível. Já só ia preso pelas patas da frente. As de trás estavam soltas, bem como o corpo todo. A boca parecia um saco cheio de ar, aberta até mais não. Os olhos… completamente alucinados. O sacana estava a gostar daquilo, só podia. Ou estaria com as patas dianteiras entaladas na porta?
Seja como for… 120 Km/h. Acho que ouvi um grito de satisfação. Só podia ter sido dele. Eu… continuava de janela fechada, apesar de já nem me lembrar do cigarro.
Acabou a recta. Tive que reduzir. Sempre de olhos postos no retrovisor continuei a viagem. Apanhei o sinal vermelho. Paro o carro. Olho pelo espelho. Continuava lá. Volto a olhar. Já não estava. Abro a porta imediatamente e espreito para o chão. O gajo estava vivo. É incrível. Olhou para trás, acho que sorriu e foi-se embora em altíssimos pulos.
As buzinas dos carros trouxeram-me a outra realidade. O sinal tinha mudado. Fechei a porta. Arranquei.
Juro que nunca tinha visto um gafanhoto tão grande, medonho e obstinado como aquele. Parecia um dragão, a sério. Pergunto-me: para onde quereria ele ir? À quanto tempo andaria ele à boleia? Qual o grau de QI daquele gafanhoto? Qual o grau de loucura? G’anda maluco.
…………………..
Ah!... tenho o cpu mais leve, pois. Estava carregadinho de todo o tipo de vírus e tretas do género. Tinha também uma carga considerável de jogos e demos que o meu filho se foi encarregando de coleccionar. Levei-o ao médico… ao cpu… e depois fiz o tratamento em casa. Está melhor. Já tenho acesso à net, ao final de quase mês e meio. O tempo é que continua a ser escasso… para escrever, digo eu.
Beijinhos a todos.
Obrigado por se manterem por aí.
Desci a escadas apressadamente, como de costume, com a mochila e a pasta. Abri a porta do carro, do lado oposto ao do condutor e atirei com as duas lá para dentro. Deixei a porta aberta e voltei a correr. Subo as escadas. Pego no cpu que já tinha previamente colocado no topo das escadas e desço novamente, desta vez com o cuidado necessário, para não me espetar ao comprido.
Encafuei o cpu aos pés do banco. Fecho a porta e dou a volta ao carro. Procuro a chave no bolso das calças e quando vou a abrir a porta… lá estava ele, 5 cm acima da fechadura, imóvel, contudo assustador. Era verde… ou seria castanho? Imenso. Olhos grandes. Pernas compridas. Acho que lhe vi uma língua bifurcada a espreitar. Fumo a sair pelas narinas. Mas… estava imóvel.
Porra!... pensei. O que é que eu faço?
Não tinha muito tempo para pensar, devido ao atraso de 10 minutos com que já estava, de maneira que agi inconscientemente (às vezes é a forma mais eficaz de agir). Devagarinho, meti a chave na fechadura e retirei imediatamente a mão. Não se mexeu.
Porreiro!... voltei a pensar. Vamos à segunda parte do plano inconsciente. Rodar a chave e abrir a porta.
Assim fiz, mantendo o corpo, o mais distante possível da porta. Entrei. Bati a porta rapidamente e olhei. Mantinha-se imóvel, sem pestanejar. Apenas me parecia ver a língua bifurcada e o fumo a sair pelas narinas, como único sinal de vida.
Caraças!... é obstinado. E agora? Não posso abrir a janela. Logo, não posso fumar. Filho-da-mãe. Bom!... nada de mais. Acendo o cigarro mais tarde, quando ele resolver sair… soltar-se… cair?!... sei lá…
Sigo viagem. Curta. Apenas 7 a 10 minutos. Faço a primeira curva. Faço a segunda curva. Olho pelo retrovisor. Continuava lá.
Chiça!... teimoso do caraças. Espera lá que eu já te digo. Vou entrar na recta.
Apanho a recta. 90 km/h.
Olho para o retrovisor. Ainda lá estava.
100 Km/h. Continua.
Vou empurrando o pedal com firmeza.
110 Km/h. Porra!... Ainda aí estás?!...
Tento observá-lo pelo retrovisor, atentamente, tanto quanto me é possível. Já só ia preso pelas patas da frente. As de trás estavam soltas, bem como o corpo todo. A boca parecia um saco cheio de ar, aberta até mais não. Os olhos… completamente alucinados. O sacana estava a gostar daquilo, só podia. Ou estaria com as patas dianteiras entaladas na porta?
Seja como for… 120 Km/h. Acho que ouvi um grito de satisfação. Só podia ter sido dele. Eu… continuava de janela fechada, apesar de já nem me lembrar do cigarro.
Acabou a recta. Tive que reduzir. Sempre de olhos postos no retrovisor continuei a viagem. Apanhei o sinal vermelho. Paro o carro. Olho pelo espelho. Continuava lá. Volto a olhar. Já não estava. Abro a porta imediatamente e espreito para o chão. O gajo estava vivo. É incrível. Olhou para trás, acho que sorriu e foi-se embora em altíssimos pulos.
As buzinas dos carros trouxeram-me a outra realidade. O sinal tinha mudado. Fechei a porta. Arranquei.
Juro que nunca tinha visto um gafanhoto tão grande, medonho e obstinado como aquele. Parecia um dragão, a sério. Pergunto-me: para onde quereria ele ir? À quanto tempo andaria ele à boleia? Qual o grau de QI daquele gafanhoto? Qual o grau de loucura? G’anda maluco.
…………………..
Ah!... tenho o cpu mais leve, pois. Estava carregadinho de todo o tipo de vírus e tretas do género. Tinha também uma carga considerável de jogos e demos que o meu filho se foi encarregando de coleccionar. Levei-o ao médico… ao cpu… e depois fiz o tratamento em casa. Está melhor. Já tenho acesso à net, ao final de quase mês e meio. O tempo é que continua a ser escasso… para escrever, digo eu.
Beijinhos a todos.
Obrigado por se manterem por aí.
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