- A mamã fazia anos hoje. É só para dar um beijinho.
Maria acaba de escrever o sms e envia-o. Primeiro, para o seu irmão João. Depois para o outro irmão, José.
Poisa o telemóvel no colo. Usa agora o telefone fixo e liga para o seu pai. Há 8 anos, neste dia, tem este procedimento.
O pai atende. Maria desenvolve conversa nada circunstancial. Propositadamente, em desencontro com a razão do telefonema. Qualquer tema serva, menos o verdadeiro. Enquanto o pai se queixa da falta de força nas pernas, resposta que ela própria lhe apontou quando resolveu perguntar “então, como é que isso vai?”, recebe a devolução do primeiro sms.
- Eu sei. Pus um lembrete no telemóvel para não me esquecer. Já telefonei ao papá. Um beijinho para ti, também.
Enquanto ouve o pai e vai acrescentando uma ou outra palavra que lhe mantenha o desenvolvimento das queixas, pergunta ao irmão:
- Ele lembrou-se?
Aguardando resposta, vai questionando o pai se tem ido a Lisboa. O pai responde que sim e torna a queixar-se das pernas, que mais dia, menos dia, não lhe permitirão tais deslocações. Entretanto, recebe resposta do outro irmão:
- Não me esqueci. Fui a casa do papá há bocado cortar o cabelo. Ele não se lembrou. Beijo.
Maria pergunta agora, pelos amigos do pai, aqueles com quem costuma ir a Lisboa. Um a um. Enquanto o pai corresponde às suas solicitações, recebe resposta à pergunta que tinha enviado ao seu irmão João:
- Acho que não. Eu não disse nada. Ele também não. Outro beijo.
Simultaneamente o pai observa:
- Tens para aí qualquer coisa a apitar.
- Estou a trocar sms com o João e o José - justifica-se.
- Olha… o João telefonou há bocado. Vem almoçar comigo no Sábado. E o José veio cá cortar o cabelo hoje. Mas eu já não posso, Maria. Vejo-me aflito com as minhas pernas… - Continua a queixar-se.
Pergunta-lhe depois pelos netos. Maria responde o mais sucintamente possível. Supõe que o telefonema está quase no fim. Esta é a pergunta que o pai costuma fazer, quando já não aguenta mais as pernas, depois de estar alguns minutos de pé, a falar ao telefone. Teimando. Teimando em não trocar aquele, por um telefone sem fios. Teimando. Teimando em não colocar ao menos, um cadeirão junto à mesinha do telefone.
- Ó filha!... eu tenho que desligar. Já estou aqui de pé, há muito tempo – ouve o pai dizer.
Maria sorriu, confirmando a sua suposição.
- Vá lá, papá… descansar. Um beijinho – despediu-se.
Até ao ano passado, não tinha, mas hoje tem, a certeza de que o pai já não se lembra de facto, do aniversário da sua mãe. Doem-lhe demasiado as pernas, para que o consiga fazer.
Melhor assim. Antes esta, que a outra dor. Porque a outra, quase lhe tirava a vida também.
Maria acaba de escrever o sms e envia-o. Primeiro, para o seu irmão João. Depois para o outro irmão, José.
Poisa o telemóvel no colo. Usa agora o telefone fixo e liga para o seu pai. Há 8 anos, neste dia, tem este procedimento.
O pai atende. Maria desenvolve conversa nada circunstancial. Propositadamente, em desencontro com a razão do telefonema. Qualquer tema serva, menos o verdadeiro. Enquanto o pai se queixa da falta de força nas pernas, resposta que ela própria lhe apontou quando resolveu perguntar “então, como é que isso vai?”, recebe a devolução do primeiro sms.
- Eu sei. Pus um lembrete no telemóvel para não me esquecer. Já telefonei ao papá. Um beijinho para ti, também.
Enquanto ouve o pai e vai acrescentando uma ou outra palavra que lhe mantenha o desenvolvimento das queixas, pergunta ao irmão:
- Ele lembrou-se?
Aguardando resposta, vai questionando o pai se tem ido a Lisboa. O pai responde que sim e torna a queixar-se das pernas, que mais dia, menos dia, não lhe permitirão tais deslocações. Entretanto, recebe resposta do outro irmão:
- Não me esqueci. Fui a casa do papá há bocado cortar o cabelo. Ele não se lembrou. Beijo.
Maria pergunta agora, pelos amigos do pai, aqueles com quem costuma ir a Lisboa. Um a um. Enquanto o pai corresponde às suas solicitações, recebe resposta à pergunta que tinha enviado ao seu irmão João:
- Acho que não. Eu não disse nada. Ele também não. Outro beijo.
Simultaneamente o pai observa:
- Tens para aí qualquer coisa a apitar.
- Estou a trocar sms com o João e o José - justifica-se.
- Olha… o João telefonou há bocado. Vem almoçar comigo no Sábado. E o José veio cá cortar o cabelo hoje. Mas eu já não posso, Maria. Vejo-me aflito com as minhas pernas… - Continua a queixar-se.
Pergunta-lhe depois pelos netos. Maria responde o mais sucintamente possível. Supõe que o telefonema está quase no fim. Esta é a pergunta que o pai costuma fazer, quando já não aguenta mais as pernas, depois de estar alguns minutos de pé, a falar ao telefone. Teimando. Teimando em não trocar aquele, por um telefone sem fios. Teimando. Teimando em não colocar ao menos, um cadeirão junto à mesinha do telefone.
- Ó filha!... eu tenho que desligar. Já estou aqui de pé, há muito tempo – ouve o pai dizer.
Maria sorriu, confirmando a sua suposição.
- Vá lá, papá… descansar. Um beijinho – despediu-se.
Até ao ano passado, não tinha, mas hoje tem, a certeza de que o pai já não se lembra de facto, do aniversário da sua mãe. Doem-lhe demasiado as pernas, para que o consiga fazer.
Melhor assim. Antes esta, que a outra dor. Porque a outra, quase lhe tirava a vida também.
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