... só para desejar
quarta-feira, dezembro 31, 2008
quarta-feira, dezembro 24, 2008
terça-feira, dezembro 23, 2008
Porque hoje é dia 23 de Dezembro...
... (estamos quase no Natal) e eu estou bem disposta, deixo-vos com este animado DJ.
sábado, dezembro 20, 2008
Provações
foto daqui
Recostada no sofá, frente à televisão, de manta enrolada às pernas, cabelo desgrenhado e vestida impropriamente, para sair à rua, Maria dos Anjos dissimula o mundo onde se encontra. Quem a vê pensará que se encontra num momento de lazer e descontracção, vendo determinado programa na televisão. Com um sorriso estúpido desenhado no rosto, sente-se protegida pelo disfarce e conta que ninguém lhe diga nada, que ninguém a faça regressar do universo onde na verdade, se encontra.
Deambula imperceptível, por entre gente de meia-idade sem tocar com os pés no chão, observando silenciosamente, como se fazem verdadeiramente, todas as observações.
Reflexivamente.
Uma mulher nua observando-se ao espelho. Ora de frente, ora de lado. Pende-se ligeiramente, para baixo e aperta uma prega de barriga entre os dedos, medindo-lhe a espessura. Endireita-se desanimada, sustem a respiração insuflando o peito e encolhendo a barriga. Não satisfeita, vai lá com as mãos palmando o ventre contra as costas. Expira longamente e pensa: Porra! Estou descomunal. Consola-se levando o seu pensamento enquanto se veste, para aquele vestido azul, comprido, quase até aos pés, em que se conseguia enfiar há uns anos atrás. O sucesso que fazia com ele.
Ressonância: FAZIA, Fazia, fazia…
Um pai divorciado entra em casa onde o aguardam os seus filhos pré-adolescentes. Porta dentro, dissimulando constrangimento, mentalmente preparado para se confrontar com as observações dos miúdos. Não foi preciso muito tempo para que eles disparassem em uníssono: Ò, pai! Furaste as orelhas?! Perde 10 cm de altura, sente um súbito calor rubrar-lhe as maças do rosto (afinal, não estava mentalmente preparado) e demoradamente, reage: Então?! Não fico giro? Os miúdos, sem conseguir proferir palavra perceptível, desmobilizam cabisbaixos, em todas as direcções, deixando para trás um homem sozinho, abandonado e inseguro. Um dos filhos volta atrás e informa: Não me vais buscar à escola assim, ouviste? Fonix! – Acrescenta.
Ressonância: OUVISTE, Ouviste, ouviste…
Um homem sentado nuns degraus junto ao mar, conversa com uma mulher com quem estreita laços. O estreitamento de laços é tão embrionário que a conversa tem pano para mangas. Final de tarde, pôr-do-sol, começa a esfriar e a conversa naquele cenário, já soma horas. O homem propõe, sedutor, decidido, atencioso, que se escolha outro local para continuar a conversa. Talvez aquele barzinho construído em madeira, onde já se acenderam as luzes amareladas que se vêem daqui. Parece-lhe um cenário alternativo àquele, pertinho do mar, com o som de fundo das ondas a desfazer-se na praia. Tão romântico. Aceite a proposta, a mulher levanta-se, prontamente. Ele tenta. As pernas não obedecem. Tinham enrijecido com o frio e a imobilidade. Ao final de duas ou três tentativas a mulher resolve ajudá-lo, puxando-o por um braço. O homem consegue manter-se de pé, equilibrando-se com esforço, tremelicando sobre duas pernas flectidas, frágeis, vacilantes. Apoia-se no ombro da mulher, demorando-se a dar literalmente, o primeiro passo. À mente, surge-lhe a vontade: … de desaparecer daqui.
Ressonância: DAQUI, Daqui, daqui…
Uma mulher vai à festa de anos do sobrinho, ainda criança. Activa e empreendedora. Sempre foi uma mulher activa, com iniciativa, bem-disposta. Uns quantos miúdos à volta de uma mesa cheia de guloseimas começam a promover brincadeiras, cada vez mais desenfreadamente, desajustadas ao espaço onde se encontram. A situação começa a fugir ao controle dos adultos que estavam de serviço como tomadores-de-conta-de-crianças-em-dia-de-festa. A mulher, prontamente, sugere que se vá jogar um jogo para o quintal, aí sim, poderiam correr, cansar-se e perder as forças. Futebol Humano – grita logo uma das crianças. Com tal força sugestiva, nem se questiona nada: Futebol Humano, será. Fazem-se duas equipas: adultos contra crianças. Grande entusiasmo e começa o jogo. As risadas são uma constante e tem que se correr. Ao final de alguns minutos (poucos) a mulher sai de jogo. Desmoralizada, descobre que já não tem esfíncter uretral que aguente simultaneamente, risos e correrias. Propõe-se por isso, fazer de árbitro.
Não há ressonância nenhuma.
Alheia, às razões porque tais pensamentos ecoam na sua mente e porque assim se constroem, Maria dos Anjos distingue-se deles, à voz usurpadora: Então, não tinhas dito que ias para o computador? Reage prontamente: E vou. E vou. Levanta-se do sofá e caminha devagar para o computador. Está capaz de enfrentar de novo, o desafio de escrever.
Experimenta um título: Crises de meia-idade.
(cinco minutos a olhar para o título)
Experimenta outro título: Ressonâncias.
(quieta)
Apaga os títulos anteriores e decide: Provações.
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