quarta-feira, janeiro 10, 2007

Tempo

Consigo finalmente libertar-me do Tempo que avança velozmente a passos largos e me arrasta, porque não lhe consigo acompanhar a passada, nem vontade tenho de o seguir, segura não sei por que parte do meu corpo. Provavelmente pelo estômago que tal como um motor cansado, fumega quente, no seu limite. Penso: O meu cérebro deve ter delegado ao meu estômago, o esforço da motricidade. Estúpido, que não lhe percebe a ilicitude da função. E o estômago coitado, que aceitou tarefa que não lhe competia.

Livre, olho-o a afastar-se, nem mais nem menos ligeiro, como se não tivesse dado conta que me deixou para trás. Sorrio quase convencida que o enganei. Escapei-lhe agora, neste preciso momento, para conseguir vasculhar na minha memória 4 datas, neste mês de Janeiro, que preservo como especiais e do resultado da cata que farei, pretendo deixar registo. Pretendo, mas não é o que farei. Porque sei, não tarda nada, o Tempo dá-se conta que me deixou escapar e voltará atrás. Enquanto vai e volta, descansa-me o estômago e somo linhas nesta folha branca.

Faz hoje 31 anos, ao descer as escadas do avião que me tinha trazido de Moçambique, senti na pele o frio mais frio que alguma vez tinha experimentado. Vestia uma mini-saia e uma blusa em voile. A minha mãe já não se devia lembrar como era o clima da metrópole, em Janeiro. Lembro-me que a caminho de casa, no táxi onde fui transportada com o meu irmão, agitava o corpo sentado no banco, olhando tudo em meu redor. Fascinei-me particularmente, com os eléctricos e com o chão calcetado, duas novidades na minha vida de menina com 11 anos.

Fez ontem 48 anos um homem que me deixou julgar minhas, todas as cores, num período em que predominavam os tons cinzentos. Um homem com quem me perco a “discutir conversas” e que não permite que o meu cérebro delegue funções a outro órgão, porque sem se dar conta, me consegue resgatar ao Tempo.

Faz amanhã 44 anos o homem que escolhi para juntos, termos filhos. Foi uma escolha acertada… essa, de ter filhos com ele. Não gosta deles, menos do que eu. Vivi com ele 19, dos 43 anos que já somei.

Faz no próximo Domingo, 12 anos que nasceu o meu primeiro filho e que dividiu a minha vida em 2 partes: Antes e depois. Com ele vivenciei todas as “primeira vez” da minha condição de mãe. Muita coisa me passou ao lado, tão ansiosa estava no meu papel, mas aquelas de que consegui ter percepção, foram vividas extasiadamente. Hoje, mais tranquila, mais quieta, sei no entanto, que voltaria a fazer tudo igual, porque na mesma e ainda, a cada situação nova, vacilo na tomada de decisões, se a elas houver lugar. A diferença é que agora, me são devolvidos todos os resultados, por ele mesmo.

Preocupam-me, é verdade, as marcas que as pressões de várias ordens, deixam na minha vida, na dos meus filhos, no meu carácter e no deles. A falta de disponibilidade faz-me sentir sobretudo, muito desorganizada. Mas também me faz sentir em falta.

8 comentários:

Paula disse...

Passei por acaso, fiquei e já li o teu blog compulsivamente de uma ponta à outra. Gosto. Tens uma escrita daquelas que revolve as entranhas (no bom sentido! não fiques com a ideia errada!) Isso é bom. provocas sensações. Não descreves só palavras, invades-me com sentimentos. obrigado por este bocadinho

Paula disse...

ah! vou linkar-te

Aq disse...

O teu comentário, fez-me lembrar de um outro que me fizeram há uns tempos e que deu de resto, lugar à criação deste blog. É agradável de quando em vez, saber de críticas à forma como escrevemos e não ao tema que escolhemos para escrever. Soube-me bem, Paula. Obrigada pelo comentário. Também já fui espreitar o teu. Logo que possa, deixo lá um registo.

Paula disse...

Estás à vontade. Mi casa, tu casa! Quero só deixar-te a nota de que o alahora é construido a quatro mãos. Sou eu e a Sarilha. Não quero tirar créditos à minha companheira de blog que despeja tão bem a sua alma para dentro do nosso blog. Obrigado pela tua atenção.

e continua o bom trabalho.

PARTILHAS disse...

Arrepiante este teu post, sobre o s teus homens... sem esqueceres... nunca... a tua mãe...

Consigo de facto imaginar-te... graças aos filmes portugueses antigos e ainda a preto e branco pela mão de tua mãe...

Comoves-me! Deve ser por isso que gosto de ti...

Aq disse...

Obrigada, Paula. Ontem estive lá um bom bocado. Acanhei-me no comentário, mas um dia destes, sai.

Chiça!... fizeste-me sentir velha - "graças aos filmes portugueses antigos e ainda a preto e branco". Eu acho que tu não precisas de estratégias para te correr a imaginação. A sério que tiveste que recorrer a esta? ;) Beijinho grande, Partilhas.

Aq disse...

Ah!... (esqueci-me) também gosto de ti e se precisares que te diga porquê, cá me desenrascarei :) Outro beijo.

Anónimo disse...

Os homens da tua vida... :-)
Mas em falta ? Não me parece...
Beijooooo
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